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09 de Setembro de 2022 Aquaculture Brasil
Lactococose: doença emergente na tilapicultura brasileira

O diagnóstico clínico da lactococose é falho, não sendo possível realizar a diferenciação das estreptococoses. Para fazer o correto diagnóstico e diferenciação entre estas doenças, torna-se necessário envio de animais moribundos, adequadamente embalados, acondicionados em gelo-água e ou gelo-gel e enviados para um laboratório especializado em diagnóstico de doenças de organismos aquáticos.

 

 

Artigo escrito Por Santiago Benites de Pádua, médico-veterinário, MSc em Aquicultura e gerente de Marketing AQUA Vaxxinova; e Henrique Figueiredo, professor do curso de graduação em Aquicultura da Escola de Veterinária da UFMG.

Lactococose é uma doença emergente na tilapicultura brasileira, sendo ocasionada por bactérias Gram-positivas ácido-láticas pertencentes ao gênero Lactococccus. Duas principais espécies de Lactococcus têm sido associadas com infecções em peixes, sendo Lactococcus garvieae e, mais recentemente, Lactococcus petauri. Ambos patógenos compartilham muitas similaridades fenotípicas, genéticas, bem como na patologia que ocasionam nos animais, causando ainda doenças similares às estreptococoses, que são amplamente conhecidas pelos criadores de tilápia.

No Brasil os registros de ocorrência de lactococose eram mais comuns em peixes nativos, especialmente em surubins, associada com a infecção por Lactococcus garvieae, havendo poucas ocorrências em tilápias até o ano de 2020, quando começamos a registrar os primeiros surtos de mortalidades associados a Lactococcus petauri em uma tilapicultura no centro-oeste brasileiro. Desde então, a doença vem dispersando e emergindo por diferentes bacias hidrográficas, especialmente no nordeste brasileiro, onde causou importantes surtos de mortalidades durante o verão dos anos de 2021/2022, com perdas acumuladas que alcançaram entre 15 a 35% de animais na fase de engorda.

Na figura 1 pode-se observar o perfil de dispersão deste patógenos nos últimos anos no Brasil, onde foram listadas fazendas que houve registro de surtos de mortalidade com isolamento de Lactococcus petauri, bem como associado com o diagnóstico de outras espécies de Streptococcus na mesma propriedade.

Figura 1. Frequência de isolamento de bactérias Gram-positivas causadoras de lactococose e estreptococoses em tilápias criadas em tanques-rede, durante a emergência de Lactococcus petauri no Brasil entre os anos de 2020-2022.

Fatores de risco

Aparentemente, pouco se conhece sobre os fatores de riscos da lactococose para tilápias, já que se trata de uma doença emergente e ainda são necessários mais estudos para melhor compreensão dos gatilhos que promovem sua infecção, perfil de susceptibilidade pelos animais ao patógeno e ocorrência de surtos de mortalidade. A partir de nossa breve experiência com este novo agente, temos observado que o aumento da temperatura da água é o principal fator de risco para ocorrência da lactococose, da mesma forma como observamos para as estreptococoses, já que os principais surtos de mortalidade foram diagnosticados entre o final da primavera e durante o período de verão, havendo diminuição de pressão pelo patógeno na medida que a temperatura da água diminuiu com a chegada do outono e inverno.

Outros fatores de riscos, tais como manejo alimentar, densidade de estocagem, alterações das condições da qualidade da água ainda devem ser avaliados para melhor compreensão da dinâmica da infecção por Lactococcus a campo. A priori, percebemos que esta enfermidade segue padrões similares aos fatores de riscos que observamos para as estreptococoses em tilápias.

 

 

Grupo de risco

Desde o primeiro surto por Lactococcus petauri diagnosticado em 2020 observamos que os peixes susceptíveis ao patógeno estavam principalmente na fase de recria e terço final do ciclo de criação, sendo diagnosticado animais com lactococose com peso a partir de 160 g de peso vivo. No entanto, nos surtos subsequentes que ocorreram no Nordeste brasileiro observamos que este patógeno passou a impactar desde as formas jovens de tilápias, onde foi possível diagnosticar a doença em juvenis com peso a partir de 30 g, porém, concentrando maior impacto em animais de recria e engorda (Figura 2).

Figura 2. Distribuição do peso (g) de tilápias infectadas com Lactococcus petauri, em fazendas no Brasil, entre os anos de 2020 a 2022. Dados registrados pelo histórico de diagnóstico do Laboratório Aquavet/UFMG, sob responsabilidade do professor doutor Henrique Figueiredo.

Patogenia e sinais clínicos

Da mesma forma como ocorrem nas estreptococoses, a infecção por Lactococcus petauri ocasiona septicemia e meningoencelite bacteriana, com acometimento do sistema nervoso central dos peixes. Desta forma, é comum observar entre os sinais clínicos a ocorrência de natação errática (Figura 3a), nado em rodopio e melanose, que é o escurecimento da coloração dos peixes. Além disso, observamos opacidade ocular (Figura 3b), que muitas vezes evolui para um processo inflamatório que acomete todos os compartimentos do olho que leva à ocorrência de exoftalmia, que é conhecida a campo como olhos saltados. Outra alteração patológica comumente observada em tilápias com lactococose é o surgimento de extensas áreas de necrose branquial (Figura 3c), que por sua vez leva ao déficit respiratório nos animais doentes. Internamente, observamos aumento do tamanho do baço (esplenomegalia) e infecção do pericárdio, denominada pericardite.

Figura 3. Sinais clínicos de tilápias com lactococose. Pode-se observar animais com natação errática na superfície das gaiolas (a), opacidade de córnea (b) e extensas áreas de necrose branquial (c).

Diagnóstico

De forma geral, todos esses sinais clínicos são os mesmos que observamos durante a infecção por Streptococcus, especialmente nas infecções por Streptococcus agalactiae sorotipo Ib e sorotipo III, não sendo possível realizar a diferenciação da lactococose e estreptococoses baseado na observação dos sinais clínicos a campo. Desta forma, a rotina de coletas de animais doentes e envio para laboratórios especializados torna-se fundamental para o correto diagnóstico da enfermidade.

O diagnóstico clínico da lactococose é falho, não sendo possível realizarmos a diferenciação das estreptococoses. Para que possamos fazer o correto diagnóstico e diferenciação entre estas doenças, torna-se necessário envio de animais moribundos, adequadamente embalados, acondicionados em gelo-água e ou gelo-gel e enviados para um laboratório especializado em diagnóstico de doenças de organismos aquáticos. No laboratório estes animais serão descontaminados, necropsiados e fragmentos de cérebro e rim serão utilizados para cultivo microbiológico em meios de cultura apropriados. Após a obtenção do isolado bacteriano, podem ser realizadas coloração, provas bioquímicas, MALDI-TOF e análises moleculares complementares para diferenciação da espécie de Lactococcus em questão.

 

 

No momento, a diferenciação das espécies Lactococcus garvieae e Lactococcus petauri não é tarefa fácil, sendo necessária a realização do sequenciamento de todo o genoma da bactéria para alcançar precisão na distinção entre estas espécies, que são muito relacionadas geneticamente e fenotipicamente. No entanto, acreditamos que em breve possamos contar com novas ferramentas mais ágeis para a distinção entre estas bactérias, mantendo a acurácia no diagnóstico.

Tratamento

Quando o assunto são as doenças emergentes, as opções de tratamento contra estas enfermidades ganham grande importância, pois antesmesmo de alcançar a entrega de vacinas customizadas que contenham a nova cepa em questão, muitas vezes torna-se necessário realizar intervenções para tratamento da enfermidade por meio de uso de antibióticos. No entanto, percebemos que o perfil de susceptibilidade de diferentes isolados de Lactococcus petauri a um variado número de moléculas antimicrobianas nos mostrou um perfil preocupante de multirresistência.

As maiores frequências de resistência foram observadas aos antimicrobianos norfloxacina, amoxicilina e florfenicol. Até o momento, não foi detectada a resistência à oxitetraciclina em L. petauri. Contudo, para algumas propriedades onde a infecção foi causada por L. garvieae, a ocorrência de resistência à oxitetraciclina foi detectada.

Vacinação

Como a lactococose trata-se de uma doença emergente na tilapicultura, ainda não estão disponíveis vacinas licenciadas contra esta enfermidade. Por outro lado, os tilapicultores têm utilizado cada vez mais soluções customizadas para promover a imunização ativa dos plantéis por meio do uso das vacinas autógenas. O incremento do uso das vacinas customizadas na tilapicultura brasileira tem sido impulsionado especialmente pela dinâmica epidemiológica que ocorre nesta atividade de criação animal, onde frequentemente emergem novos desafios sanitários, bem como novas variantes genéticas dos patógenos previamente estabelecidos.

Para produção de uma vacina autógena contra a lactococose, necessariamente os técnicos de campo e ou produtores precisam contatar um profissional de saúde que irá realizar a coleta de peixes doentes na propriedade alvo, onde esteja ocorrendo os casos clínicos da doença e enviar as amostras clínicas para um laboratório especializado em diagnóstico de peixes.

Com a obtenção do isolado de campo da bactéria Lactococccus petauri, é feita uma prescrição do uso de vacina autógena contra este patógeno e solicitada autorização de produção da vacina para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Após a obtenção da aprovação de produção da vacina autógena pelo ministério, que ocorre em até 48 horas após a realização do pedido, a indústria veterinária habilitada recebe o isolado de campo e prepara a produção de “sementes” para produção da vacina utilizando a bactéria isolada dos peixes doentes (Figura 4).

Figura 4. Etapas de colheita de amostras clínicas, diagnóstico laboratorial, prescrição da vacina pelo médico veterinário, pedido de autorização junto ao MAPA e produção das vacinas autógenas utilizadas para tilapicultura.

Desta forma, proporcionamos alta especificidade antigênica necessária para o controle da doença, com uso de cepas bacterianas que ocorrem a campo, obtendo máxima proteção para o plantel vacinado com um produto customizado. Além disso, outro grande benefício das vacinas autógenas é a agilidade em entregar soluções contra doenças emergentes, como o caso da lactococose, que ainda não possuem vacinas licenciadas no mercado, proporcionando uma solução efetiva para redução no uso de antibióticos para tratamento da doença, além de promover mais saúde e bem-estar animal durante o ciclo de produção protegido contra os patógenos.

 

Fonte: O Presente Rural

 

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