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01 de Outubro de 2017 Aquaculture Brasil
João Felipe Moutinho Sant´Anna

AQUACULTURE BRASIL: João, nossa pergunta de praxe, conte-nos um pouco da sua carreira de graduação e como a aquicultura foi fazendo parte da sua vida.

João Moutinho: Tenho muita honra e satisfação em dizer que a Aquicultura é minha grande paixão de vida pessoal e profissional. Essa atividade entrou muito cedo na minha vida, uma vez que a relação com a pesca e aquicultura começou logo a partir dos meus 5 ou 6 anos de vida, me envolvendo com as pescarias como hobby e depois passando a questionar as relações ecológicas, as diferentes iscas para diferentes tipos de peixes, enfim. Dos 12 aos 15 anos me dediquei muito a pesca esportiva, não somente pescando, mas estudando e trazendo muita informação de fora do país, principalmente dos Estados Unidos. Essa relação com a pesca, além dos investimentos que estavam ocorrendo na época, a exemplo da instalação da empresa Mar e Terra, no Norte do país, me levaram a pensar em cursar Aquicultura. Juntamente com meu pai, já achávamos que esta era uma zona promissora de trabalho e justamente em uma área que eu me identificava. O fato se encaixou naquele ditado “Faça do teu trabalho um lazer, para que você possa fazê-lo bem todos os dias”. Prestei vestibular para Biologia e Oceanografia, passando nas duas, mas decidi cursar Biologia por ser na cidade em que morava, Ponta Grossa/PR. Fiz parte da primeira turma de Bacharelado em Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG (2002/2005). Na época não havia nenhum professor ligado diretamente com a Aquicultura, somente o Prof. Dr. Roberto Ferreira Artoni que se dedicava a citogenética de peixes. Na graduação fiz estágio em outras áreas, mas nenhuma me despertava muito interesse. Por fim, decidi trabalhar nesse laboratório, embora minha vontade fosse de trabalhar na ecologia da produção, compreender sistemas, entre outros. Tive a felicidade de trabalhar com isso no meu TCC, onde desenvolvi o trabalho intitulado “Levantamento rápido de peixes em uma lagoa Marginal do rio Imbituva na bacia do alto rio Tibagi, Paraná, Brasil”. Nesse trabalho coletamos em torno de oito espécies e uma delas inédita ainda na bacia do rio Tibagi, a Mimagoniates microlepis, vulgarmente conhecido como lambari tetra azul. Saindo da graduação decidi que queria focar em aquicultura.

 

AQUACULTURE BRASIL: Então optou pelo mestrado?

João Moutinho: Sim, escolhi o CAUNESP e fui conhecer o centro em busca de um laboratório que pudesse me oferecer uma oportunidade de estágio. Ali conheci uma pessoa bastante especial, o Prof. João Batista, do Laboratório de Peixes Ornamentais e Pesquisa com Nutrição em Tilápias. Apresentei a ele meus objetivos, com o que gostaria de trabalhar e prontamente o Prof. João me ofereceu a oportunidade de realizar um estágio, não remunerado, mas onde eu poderia ter a experiência de montar um Laboratório de Peixes Ornamentais que começava a ser estruturado. Aceitei a proposta e fiquei no ano de 2006 morando em Jaboticabal por cerca de oito ou nove meses. Como não tinha bolsa, realizava alguns trabalhos paralelos, como garçom em pizzaria, afim de me manter na cidade e trabalhando com o que gostava, que é aquicultura A ideia era fazer mestrado nesta instituição, contudo, em virtude de alguns fatores, a data de ingresso foi adiada em dois meses. Já estava desanimado com o fato de não saber se iria conseguir permanecer lá ou não e nesse período surgiu uma vaga para trabalhar em um projeto de Produção e Reprodução de Peixes Marinhos e Ostras no Litoral do Paraná, no CPPOM, e fui convidado a participar, pelo Prof. João Batista, que ficou sabendo da vaga. De imediato aceitei a proposta, indo morar em Guaratuba/PR. Fiquei responsável pelo setor de produção de fitoplâncton, e na época o projeto era novo, existia a estrutura, mas não tínhamos ainda protocolos definidos. Estudamos muito, nos conectamos com pesquisadores fora do Brasil para poder produzir. Nosso objetivo era produzir juvenis de robalo para fazer repovoamento da baía de Guaratuba e sementes de ostras para os pescadores artesanais cultivarem. Assim, minha responsabilidade era grande, porque estava na base dessa cadeia produtiva. Fiquei no projeto por quase um ano, quando senti a necessidade de avançar, buscando me aperfeiçoar com a realização de um mestrado. Conversei com o coordenador do projeto, que também achou interessante e então fui fazer mestrado em Biologia Evolutiva, na UEPG, trabalhando com meu antigo orientador da graduação, o Prof. Roberto Artoni. Desenvolvemos um projeto com uma espécie endêmica do Rio Iguaçu, o Steindachneridion melanodermatum conhecido como monjolo ou surubim do rio Iguaçu. Fizemos um trabalho de ontogenia, desenvolvimento embrionário e análise qualitativa e quantitativa do sêmen do animal, que foi muito importante para estudos sobre a reprodução da espécie, que tinha por fim o repovoamento dos rios. 

 

 

AQUACULTURE BRASIL: E quando ingressou no mercado profissional?

João Moutinho: Nesse período (2007/2008), empresas de grande porte começaram a ter interesse no setor aquícola, a exemplo da Bayer, primeira empresa multinacional na qual trabalhei. Fiquei responsável pela região sul do país, com objetivo de abrir mercado e comercializar o primeiro ectoparasiticida registrado no Brasil, o Masoten. A empresa tinha somente um produto específico para a aquicultura e uma linha de biossegurança focada no controle de pragas e higienização. Desde 2008 já se falava em higienização de equipamentos e estruturas de laboratório, como incubadoras, além de tanques-rede, etc. Na época era muito difícil falar isso ao produtor e mostrar a necessidade da biossegurança, mas o tempo veio mostrando que realmente esse fator tem grande importância em todos os segmentos da produção. Até 2010 fiquei focado em aquicultura e após, fui destinado, por uma estratégia da empresa, para a área de suínos e aves, onde permaneci por mais um ano. Foi um grande aprendizado, uma vez que tive o contato com outras empresas de grande porte (BRF, JBS), reuniões com fundo corporativo e técnicos com larga experiência. Em 2012 tive uma passagem rápida pelo grupo InVivo, na área de Aquicultura, estando como supervisor técnico do setor Aqua da região norte do país. Porém, quando na Bayer, tive uma relação grande com os profissionais Rodrigo Zanolo e Leonardo Cericato, que trabalhavam com um projeto de vacinas para peixes. E essa relação estava desenhada para que quando eles necessitassem de um profissional nesta área, nós conversássemos.E justamente neste período surgiu essa oportunidade, e a vacinação era algo que considerava fantástico, inovador, enfim, algo com o qual eu queria muito trabalhar. Assim, acabei aceitando a proposta e indo trabalhar na MSD Saúde Animal, local no qual aprendi muito e tenho imenso orgulho em ter passado por essa empresa.

 

AQUACULTURE BRASIL: Dentro da MSD, quais atividades você desenvolvia?

João Moutinho: Fiquei responsável pelas áreas com produção de tilápia na região Sul e Sudeste, indo morar em Santa Fé do Sul/SP e permanecendo por dois anos neste segmento de sanidade. Trabalhávamos no entendimento da importância do controle bacteriano, a ferramenta da vacina em si e como ela interagia com o animal, e também quais eram as responsabilidades do produtor para que esse manejo também tivesse resultado. Foi um trabalho envolvendo todos os pilares da aquicultura e conscientização dos produtores do por que vacinar, quando deveria ser vacinado, enfim. Além da oportunidade em conhecer pesquisadores de fora do Brasil, que me trouxe uma bagagem muito grande.

 

AQUACULTURE BRASIL: Você saiu da MSD, que sem dúvida é uma grande empresa, para seguir o próprio negócio com a BIOFISHE’S. Como foi esse processo e qual sua situação profissional atualmente?

João Moutinho: Na metade de 2015 tive a oportunidade de conhecer um mundo diferente, que é a parte de biotecnologia, através de uma empresa que trabalhava com organominerais. Contudo, o produto era totalmente voltado para a agricultura, e eu via ali um potencial para aquicultura. Dessa forma, acabei ingressando junto, em uma parceria, pensando no conceito de ecologia produtiva. O objetivo é usar o adubo organomineral, junto de bactérias com princípios probióticos, adicionadas no produto, e dentro de um único produto ser possível atender o cliente. Dar o start ao viveiro com a produtividade primária, através dos organominerais, e manter estável o ambiente para diminuir o estresse dos animais, mantendo o ambiente de cultivo padronizado. Foi aí então que acabei me desligando da MSD para ingressar nesse projeto, que é a criação da empresa BIOFISHE’S - Biotecnologia para Vida. Permaneci como consultor e representante de vendas até final de 2016, e no início de 2016 passei por um segundo desafio, com a BIOFISHE’S, que foi o de ser consultor da Phibro no Brasil. A Phibro é uma multinacional americana do setor de aves, suínos e agora aquicultura. Há dois anos atrás adquiriu uma empresa de Israel, prestadora de serviços no setor de aquicultura, chamada AquaVet. No Brasil a empresa ainda não conhecia o mercado, portanto fizemos um trabalho de apresentação e introdução dos produtos da Phibro tanto da parte sanitária quanto nutricional. Durante este trabalho, que se estendeu até julho deste ano, conhecemos uma empresa no Mato Grosso, chamada Tecnomerc, gerida por dois sócios fundadores e que atua na prestação de serviços e distribuição de produtos, inclusive já atuavam na distribuição de produtos da Phibro na linha de suínos e aves, e logo demonstraram interesse também pelos produtos da aquicultura. Nesse sentido, fomos convidados a participar de uma nova unidade de negócios da empresa, onde hoje faço a parte da gestão, em conjunto com o diretor comercial, elaborando um plano de negócios a nível de Brasil, mas focado especialmente na região do Mato Grosso, Tocantins, entre outros. Hoje então faço parte, com a BIOFISHE’S da equipe da Tecnomerc, em um trabalho de consultoria e gestão técnica-comercial, com diversas empresas, inclusive a Phibro, fazendo a distribuição dos produtos.

 

AQUACULTURE BRASIL: Quais ferramentas existentes hoje no Brasil para ampliar a biosseguridade e a prevenção de enfermidades na aquicultura que você destacaria?

João Moutinho: Para o segmento da carcinicultura, com toda certeza, seriam os sistemas intensivos e controlados (temperatura, análise de água, relação de micro e macronutrientes). Com isso se cria um sistema padrão e biosseguro, evitando oscilações. E nos peixes, a vacina, creio que é a ferramenta mais estratégica. Claro que aditivos e uma nutrição adequada também são ferramentas essenciais. Inclusive acredito que teremos uma revolução muito grande na área de nutrição de organismos aquáticos, como por exemplo, alteração por fonte de proteína vegetal (não total, mas de forma parcial). É necessário olhar um pouco mais para a relação dos animais com o seu meio natural e assim teremos condições de substituir os componentes que favoreçam essa questão. A parte ambiental também é um aspecto importante, como dizem, precisamos cultivar água, ao invés de peixes e camarões. Buscar entender e deixar o ambiente o mais propício possível para estes organismos.

 

AQUACULTURE BRASIL: A piscicultura brasileira vem batendo recordes anuais de produção. Por outro lado, dados do IBGE mostraram que a carcinicultura marinha fechou 2016 com a menor produção em mais de 10 anos. Quais motivos deste, digamos, paradigma? Há lições da piscicultura brasileira que a carcinicultura poderia se espelhar?

João Moutinho: Não acredito que a piscicultura tenha lições para dar a carcinicultura, porque são organismos diferentes, com capacidades de defesas diferentes. Assim, esses organismos estão na mão de pessoas que fazem essa relação de ambiente x animal, do quanto posso explorar disso, e as vezes por uma ambição natural, positiva muitas vezes, extrapolam densidades, deixam a desejar no manejo e torna-se gradativo o processo de favorecimento do desenvolvimento de enfermidades, chegando ao ponto de desenvolver a patogenia. Como foi o caso da mancha branca. Mas vejo com bons olhos o que tem acontecido no Nordeste. Num espaço de dois anos se revolucionou a forma de pensar, abriu-se para as novas tecnologias e  isso é muito importante. As grandes civilizações só evoluíram depois de um momento de catástrofe natural ou provocada por guerras, momento este que faz as pessoas pararem para reavaliar a forma de fazer as coisas e também de se unir. Dessa forma, acredito que a mancha branca serviu para isso. A piscicultura talvez não tenha levado um “baque” tão forte e por isso deu espaço para esse sucesso, quando comparada a carcinicultura. Mas não há como comparar, na carcinicultura há uma situação pontual e específica, que tem que ser trabalhada.

 

AQUACULTURE BRASIL: Como estará a Aquicultura brasileira daqui 20 ou 30 anos?

João Moutinho: Vejo cenários muito positivos, no mínimo para os próximos 30 anos. É uma atividade que vai crescer se não dois dígitos, próximo disso, nos próximos 30 anos. Temos bons exemplos, como a própria Noruega, com um setor muito organizado, com políticas claras, e que só temos a nos espelhar.

A partir de 2020 acredito que o Brasil vai estar exportando tilápia e muito bem. Todo o canal que grandes empresas já utilizam para exportação de outros produtos, será sem dúvida aproveitado também com os produtos da aquicultura. A exemplo da C.Vale que inaugurou recentemente o novo frigorífico. Tem uma legião boa de pessoas envolvidas, pessoas que já lutavam a um bom tempo e agora tem orgulho de ver tanta coisa acontecendo. Muita coisa saiu do papel e só das palavras e está sendo praticada. 

 

AQUACULTURE BRASIL: Gostaria de dizer algo para finalizar?

João Moutinho: Gostaria de parabenizar a toda a equipe da Aquaculture Brasil, em especial ao Giovanni, editor da revista, que é uma pessoa extraordinária e com uma visão muito bacana. Me identifico muito com ele, suas perspectivas, e desejo que continuemos por esses 30 anos que comentei, juntos.

 

 

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Charge Edição nº Publicado em 18/09/2023
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