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Biotecnologia de algas
01 de Agosto de 2018 Roberto Bianchini Derner
Quando as microalgas se tornam indesejadas: floração de algas nocivas

 

 

 

Diferente das colunas anteriores, nas quais tratamos das aplicações biotecnológicas das algas e de aspectos do metabolismo destes organismos, nesta coluna trataremos de alguns casos em que as microalgas se tornam indesejadas.

Neste sentido, sem dúvida o assunto mais discutido é o da proliferação muito intensa de determinada população de microalgas no ambiente natural, ou em um tanque de cultivo de peixes, por exemplo. Este fenômeno natural é conhecido como Floração de Algas Nocivas (FAN), ou Harmful Algal Bloom (HAB), e sua ocorrência têm estreita relação com parâmetros ambientais, quando variações nas correntes, regime de ventos, aporte de nutrientes, salinidade, iluminação e na temperatura da água, dentro outros fatores, induzem uma população de poucas células microalgais a uma proliferação massiva, ocasionando, em poucos dias, uma FAN que pode ser deslocada pelos ventos e correntes e alcançar áreas de pesca, de cultivos aquícolas, de lazer e de captação de água para consumo humano, por exemplo.

As FAN podem ocorrer tanto em ambiente marinho quanto em água doce e, algumas são conhecidas popularmente como “marés vermelhas”, quando se tratam de florações de dinoflagelados com pigmentação avermelhada, entretanto, podem ser de outras cores, relacionadas aos táxons (diatomáceas, cianobactérias, clorofíceas etc.) e aos respectivos pigmentos sintetizados pelas células algais.

Cabe esclarecer que uma FAN não necessariamente se refere à florações de microalgas produtoras de toxinas (ficotoxinas). Em muitos casos, basta que ocorra uma proliferação muito intensa de qualquer espécie de microalga para que as condições ambientais possam sofrer alterações, principalmente em relação à concentração do oxigênio dissolvido, pH, cor, odor e até no gosto da água. Tanto no ambiente natural quanto nos ambientes de cultivos, uma população muito densa de microalgas pode consumir todo o oxigênio dissolvido na água (por sombreamento, pela respiração ou no processo de decomposição das células mortas), levando à morte todos os outros organismos naquele local, causando muitos prejuízos ambientais e econômicos, como grandes mortandades de peixes, moluscos e crustáceos, com registros de ocorrência no Brasil e em muitos outros países.

 

 

 

 

Grande atenção é necessária, e tem sido verificada em alguns casos, no monitoramento da ocorrência de espécies de microalgas potencialmente produtoras de toxinas nos locais de cultivo de moluscos filtradores (ostras, mexilhões e vieiras). Estes moluscos obtém seu alimento através da filtração das partículas em suspensão na água - incluindo células microalgais, que constituem o fitoplâncton – e o problema decorre da possibilidade destas ficotoxinas (algumas muito potentes) serem concentradas na carne dos animais (bioacumulação). Geralmente, as toxinas não causam mal aos moluscos, entretanto, podem causar diversos tipos de envenenamento nos organismos – incluindo o homem - que se alimentaram dos moluscos contaminados. Menos mal que uma vez que a floração desapareça, após alguns dias os moluscos podem se depurar naturalmente, e o seu consumo pode ser retomado sem riscos.

Outros possíveis problemas ocasionados pelas FAN são relacionados ao envenenamento através da pele pelo contato com estas ficotoxinas presentes na água e/ou pela possibilidade de determinadas microalgas causarem obstrução das brânquias de animais aquáticos, ou de espécies com frústulas causarem microferimentos nas brânquias destes animais, sendo os ferimentos a porta de entrada para micro-organismos como bactérias e fungos, causadores de doenças secundárias. Bem conhecido nas estações de captação de água de muitas cidades, bem como dos produtores de peixes de água doce - mas não exclusivamente, uma vez que também pode ocorrer em peixes e camarões marinhos, o off-flavor (gosto e/ou cheiro de terra ou mofo) causado pela presença, principalmente, de algumas cianobactérias é um problema que ocasiona expressivas perdas econômicas na aquicultura, uma vez que os produtores precisam tomar medidas visando tanto à eliminação destas microalgas dos sistemas de cultivo quanto à depuração dos animais, visto que muitos mercados rejeitam o produto no caso de ser constatado o off-flavor.

Em relação à saúde humana, um caso muito grave de envenenamento por ficotoxina ocorreu numa clínica em Caruaru, PE, em 1996, quando 65 pacientes morreram após o procedimento de hemodiálise no qual foi acidentalmente empregada água contaminada com microcistina, uma potente hepatoxina sintetizada por cianobactérias do gênero Microcystis.

Assim, seja para o desenvolvimento das atividades aquícolas, como para o lazer ou para o abastecimento de água das cidades, é muito importante o desenvolvimento de planos de monitoramento e, se possível o controle, das populações de microalgas, particularmente daquelas potencialmente produtoras de toxinas. E para não fugir completamente das aplicações biotecnológicas das microalgas, nesta coluna as ficotoxinas foram apresentadas de maneira negativa, porém, quem sabe algumas possam ser estudadas e virem a ser empregadas na elaboração de medicamentos.

 

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Capa do colunista Roberto Bianchini Derner
Roberto Bianchini Derner

Biólogo, Mestre em Aquicultura e Doutor em Ciência dos Alimentos pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pesquisador e Gerente do Setor de Microalgas do Laboratório de Camarões Marinhos da UFSC entre 1989 e 2006. Atualmente é professor no Departamento de Aquicultura e supervisor do Laboratório de Cultivo de Algas (LCA). Coordena diversos projetos de pesquisa na área de recursos pesqueiros e engenharia de pesca/biotecnologia, com ênfase em aquicultura/algocultura - cultivo de microalgas para a produção de compostos bioativos (pigmentos, ácidos graxos, polissacarídeos etc.), biocombustíveis (biodiesel, bioetanol etc.) e tratamento de efluentes líquidos e gasosos.

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