É novamente com grande alegria e satisfação que a coluna “Green Technologies” volta a discutir os caminhos mais ecológicos ou “verdes” da produção aquícola. E nesta coluna em especial vamos refletir sobre a real aplicação das novas tecnologias no setor produtivo, com um olhar especial ao sistema de bioflocos. Em outras palavras, se os esforços em pesquisas e desenvolvimento tecnológico estão “aterrissando” e impactando o setor produtivo. Será que sim?
Já é do conhecimento de muitos que o sistemas de bioflocos (ou BFT na sua sigla em inglês), oferecem um conjunto de notáveis vantagens tais como:
Assim, devido a estes e muitos outros atributos, esta tecnologia atualmente está em um vertiginoso crescente no mundo e que inclusive também é destaque nesta primeira edição da AQUACULTURE BRASIL.
Em relação a sua história, uma breve reflexão do sistema nos remete aos anos 70 na França (mais precisamente no Taiti, Polinésia Francesa). Por meio do instituto francês IFREMER, além de um consórcio realizado pelos franceses com algumas empresas privadas norte-americanas, o sistema nasceu e iniciou-se a aplicação do conceito de “trocas de água mínimas” com altas densidades de estocagem com camarões marinhos em fazendas no Taiti (um exemplo é a empresa Sopomer naquele país) e também nos EUA. Anos se passaram, e um segundo momento ocorreu no final dos anos 80 e início dos anos 90 em Israel (com peixes) e novamente EUA (com camarões), ambos em centros de pesquisas. As principais aspirações ou motivações até então eram relacionadas com a escassez de água, com os efluentes gerados e/ou com o custo das terras em certas localidades. O sistema realmente emplacou e começou a ganhar “asas”, se disseminando pelo mundo, a partir do ano 2000. Projetos comerciais tais como “Belize Aquaculture” em Belize na América Central, depois na Tailândia, pelo grupo CP Prima e posteriormente na Malásia pela empresa “Blue Archipelago”, foram verdadeiras “escolas” para os projetos comerciais que existem na atualidade, principalmente se tratando de fazendas de maior escala. Grandes “autoridades” mundiais do sistema BFT da atualidade passaram por essas escolas. Realmente sem a iniciativa e coragem (ou necessidade?) destes projetos pioneiros, possivelmente estaríamos ainda longe do que vemos hoje.
E a relação com a ciência e as pesquisas? Será que houveram impactos vindos da academia rumo ao setor produtivo? Podemos afirmar com propriedade que sim! E isso é louvável! Aqui vale um parênteses: o objetivo desta coluna não é discutir a importância da ciência básica versus ciência aplicada. Ambas são importantes e necessárias. Mas infelizmente vemos ao redor do mundo (e certamente incluindo o Brasil) milhões de dólares (ou reais) sendo desperdiçados em pesquisas sem direção, rumo ou aplicação alguma.
O interessante é que no sistema BFT as primeiras iniciativas nasceram em centros de pesquisas e logo após já foram aplicadas comercialmente, via parcerias e colaborações. Isso desde os anos 70! Basta um olhar para trás na história. E atualmente grandes corporações aquícolas que utilizam o sistema BFT investem em P&D, criando setores de pesquisa dentro das próprias fazendas, aperfeiçoando e replicando seus protocolos e manejos. Certamente este é o rumo, este é o caminho. Como costumo sempre dizer “não existe uma receita de bolo” para esta tecnologia, cada realidade é distinta. Sendo assim, investir em pesquisa é investir na sustentabilidade dos projetos.
Curiosamente ao realizar uma breve busca na base científica de dados do “Scopus” (uma das mais importantes e respeitadas no mundo), colocando como palavra-chave “biofloc”, encontramos o primeiro artigo publicado em 1998. Vale ressaltar dois pontos: no início o sistema BFT era conhecido por diversos outros nomes, termos e siglas tais como “active sludge” ou lodo ativo, “ZEAH” ou “zero exchange autotrophic heterotrophic system”, “floc system”, “moulinet” (ou molinete em francês, devido ao giro ou movimento de água), entre outros; e que certamente foram publicados muito mais artigos, mas que não estão indexados nesta base de dados.
Mas adotando como exemplo o período a partir de 1998, vemos um crescimento exponencial nas pesquisas, conforme mostra a Figura 1. E este crescimento veio acompanhado de um aumento de iniciativas comerciais, seja em alguma fase específica (por exemplo, em berçários de camarões ou manutenção de reprodutores de peixes), ou durante todo o ciclo de engorda das espécies. Para se ter uma idéia do avanço desta tecnologia, em uma das maiores regiões produtoras de camarões das Américas, os estados de Sonora e Sinaloa no norte do México (que juntos já chegaram a produzir mais de 100 mil toneladas de camarão em um ano), mais de 80% das grandes fazendas adotam o sistema de bioflocos em ao menos uma das etapas de produção (geralmente na fase de berçário ou “maternidades” como chamam nossos hermanos mexicanos). Isso é um belo exemplo de tecnologia aplicada, com base científica, mas vinculada a capacitação de recursos humanos, prática que aquele país tem investido fortemente nos últimos anos.
No Brasil, a exemplo de outras partes do mundo, a aplicação ou “aterrisagem” da tecnologia também ocorreu e ainda ocorre. Em 2004-2005, quando o sistema de bioflocos estava apenas chegando em nosso país, praticamente eram nulas as fazendas comerciais que adotavam esta tecnologia. No período próximo a 2010 já existiam cerca de 8 fazendas comerciais realizando testes ou incorporando o sistema BFT, principalmente na região sul do Brasil. Atualmente, já se tem conhecimento de mais de 30 fazendas que operam o sistema BFT em terras brasileiras, em ao menos alguma etapa de produção. E a tendência, tanto para camarões marinhos como para peixes, é de crescimento. Mas por quê? Bom, são inúmeros os motivos que vão desde a busca de uma maior sustentabilidade dos cultivos (possibilitando agregar valor aos produtos), ou motivados por eventos específicos tais como surgimento de enfermidades, fatores climáticos, necessidade de aumento de produtividade, escassez de água, entre outros fatores. Algo é certo, ainda vamos ouvir falar muito deste sistema. É ver para crer.
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Maurício Emerenciano é graduado em Zootecnia (UEM), mestre em aquicultura (FURG) e doutor em Ciências pela UNAM (México). Em 2014 foi ganhador da Medalha Alfonso Caso (menção honrosa designada às melhores teses e dissertações dos Programas de Pós-Graduação da UNAM/México). Atua na aquicultura desde 2002 e como pesquisador já realizou cooperação científica em diversos centros de pesquisa como Waddell Mariculture Center (EUA), CSIRO (Austrália) e IFREMER (França). Foi consultor científico em aquicultura para o governo do Chile, do México e Polinésia Francesa (Pôle d’Inovación de Tahiti). Membro do Biofloc Technology Steering Committee (AES), voltado a ações científicas e tecnológicas referentes ao sistema BFT. Possui capítulo de livro referência mundial da tecnologia de bioflocos (Biofloc Technology - The practical guide 3rd edition). Já proferiu mais de 20 cursos e diversas palestras sobre tecnologias “mais verdes” de produção para produtores, indústria e academia no México, Brasil, Chile e Colômbia. Atualmente é professor e pesquisador da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), campus Laguna/SC, onde coordena projetos de pesquisa vinculados ao setor público e privado.
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