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Cultivo de Camarões
01 de Outubro de 2017 Aquaculture Brasil
A utilização de berçários e raceways em fazendas de camarão marinho Litopenaeus vannamei no Brasil: III - Critérios para povoamento e engorda

Nos dois primeiros artigos desta série sobre cultivo de Litopenaeus vannamei em berçários e raceways, publicados nas edições 4  e 5  da Revista Aquaculture Brasil, apresentamos temas como caracterização dos sistemas intensivos, tipos de estrutura e materiais utilizados na construção dos tanques, desinfecção/esterilização e técnicas de fertilização/preparação da água para o cultivo. Neste terceiro artigo, abordaremos importantes estratégias para o povoamento e engorda de pós-larvas e juvenis de L.vannamei em berçários e raceways.

 

Qualidade das pós-larvas

A palavra do momento na carcinicultura marinha brasileira é o “enfrentamento” de doenças. Neste contexto, a qualidade das pós-larvas e, consequentemente, o seu desempenho nas fazendas têm sido um dos pontos de maior atenção e reflexão por parte do setor produtivo. Pós-larvas com baixa qualidade podem ser responsáveis por danos consideráveis nos cultivos, comprometendo seriamente a produção inicialmente planejada. Como exemplo, segundo Muthusamy (2013), pós-larvas com baixa qualidade foram associadas a 80% das ocorrências de AHPNS (Acute Hepatopancreatic Necrosis Syndrome) e EMS (Early Mortality Syndrome) na criação de L. vannamei na Malásia.

Atualmente existem diversas metodologias de avaliação à campo da qualidade das pós-larvas, todas de fácil e prática execução, podendo inclusive fazer parte da rotina operacional das fazendas (Tabela 1). Outros testes mais específicos para determinadas enfermidades podem ser realizados em laboratórios qualificados, aumentando, neste caso, o nível de biosseguridade do empreendimento.

 

Densidade de povoamento nos berçários e raceways

A elevação das densidades de estocagem implica, majoritariamente, no aumento da oferta de ração nos tanques, refletindo diretamente em diversos parâmetros de qualidade da água, como:

  • Aumento de sólidos suspensos totais (SST);
  • Queda do pH;
  • Queda da alcalinidade;
  • Aumento do consumo de oxigênio dissolvido;
  • Elevação da produção de compostos nitrogenados tóxicos;
  • Rápida elevação da amônia e, posteriormente, do nitrito e nitrato (principalmente em raceways, devido ao maior tempo de cultivo).

Estas alterações, associadas à elevada biomassa estocada, podem causar estresse nos animais e um aumento da probabilidade de problemas zootécnicos e sanitários (patogenias). Monitorar e corrigir rapidamente os principais parâmetros de qualidade de água é fundamental para o sucesso da produção de juvenis em sistemas intensivos. Atenção total, 24 horas por dia, também são fatores determinantes (Figura 1).

Densidades moderadas, por exemplo, de 1000 a 2000 PL´s/m³ (ou seja, 1-2 PL´s/L) possibilitam o alcance de pesos médios finais acima de 1,0 g em 30-35 dias, mantendo os níveis de sobrevivência acima de 85%, desde que o manejo seja adequado.

Em berçários com densidades de estocagem elevadas, entre 5.000 PL´s/m³ a 20.000 PL´s/m³ (ou seja, 5-20 PL´s/L) e a partir de ciclos mais curtos (< 20 dias), o peso médio final se reduz consideravelmente, podendo ficar em torno de 0,025 a 0,2 g (ou 40 – 5 PL´s/g) (Figura 2). Em resumo, sob densidades muito elevadas, o produtor gasta um bom tempo e investimento, além dos riscos associados a esta etapa inicial, mas acaba produzindo juvenis muito pequenos e provavelmente não “preparados” para os desafios das próximas fases de engorda.

É importante ressaltar que além da densidade de estocagem, a biomassa final prevista (número de indivíduos x peso x sobrevivência/volume de água) deve ser levada em consideração. Biomassas finais em sistemas intensivos e superintensivos em raceways e berçários comerciais variam em torno de 1 kg/m3 até 5kg/m3 (Samocha, 2010). O adensamento sem um maior controle poderá resultar em juvenis sem qualidade e desuniformes (Figura 3), prejudicando a fase posterior de cultivo, ou seja, a engorda final dos camarões.

O crescimento dos camarões é verificado pelo peso médio dos indivíduos, em gramas. No caso dos berçários e raceways, essa avaliação pode ser feita semanalmente, através de biometrias, ou mesmo por um índice diário (por exemplo, GPD – Ganho de Peso Diário) devido ao reduzido período do ciclo (comparado aos viveiros de engorda). O ganho de peso está relacionado principalmente com a genética dos animais e a fatores como densidade, alimentação, manejo, qualidade de água, entre outros.

Na Figura 4, apresenta-se a curva de crescimento de pós-larvas de L. vannamei em um raceway de 700 m³, construído no litoral de Pernambuco, utilizando uma densidade moderada de 1.000 a 1.500 PL´s/m³, em sistema de estufa com controle de temperatura.

 

 

Crescimento compensatório

O crescimento compensatório de camarões marinhos da espécie L. vannamei em sistema intensivo foi relatado por Foes (2016) e também por diversos outros autores. A ideia seria manter os animais em densidades elevadas por um longo período inicial de cultivo (até 60 dias), onde a taxa de crescimento será apenas “moderada”. Numa segunda etapa, os juvenis são transferidos para outros tanques e/ou viveiros, onde encontram maior espaço e melhores condições, reduzindo-se consideravelmente a densidade inicial e a biomassa estocada. A partir deste momento, os juvenis recuperariam o “crescimento perdido” na fase anterior.

Essa alternativa vem sendo cada vez mais utilizada no Brasil, especialmente em raceways (Figuras 5, 6 e 7), para fins de ajustes nas programações de povoamento dos viveiros de engorda, antecipação dos cultivos posteriores e aumento do número de ciclos/ano. Entretanto, fica a dúvida se o crescimento compensatório se aplicaria para as diferentes linhagens disponíveis no Brasil.

 

Sobrevivência

A sobrevivência dependerá da qualidade das pós-larvas, da qualidade de água e do tipo de manejo empregado nos berçários e raceways. Pensando-se no mesmo tipo de sistema (por exemplo: BFT), a sobrevivência será inversamente proporcional à densidade de estocagem e também ao tempo de cultivo. Estudos realizados em um tempo de cultivo fixo de 35 dias (Figura 8), variando-se a densidade de estocagem, apontaram a possibilidade de se manter um bom nível de sobrevivência (acima de 85%) nas densidades de 2,0 a 4,0 PL´s/ L (Garcia, 2014). O aumento da densidade, no mesmo tempo de cultivo, reduziu consideravelmente as taxas de sobrevivência.

Relatos indicam que produtores do México, em 2014, tendo em vista a chegada da EMS (Early Mortality Syndrome), modificaram a estratégia de produção nos raceways, reduzindo as densidades de estocagem para 1,5 PL´s/L e mantendo os juvenis de L. vannamei por cerca de 55 dias, visando atingir pesos médios superiores a 4,5 g, com 80% de sobrevivência e, posteriormente, povoar os viveiros de engorda em baixa densidade (6- 7 juvenis/m²). Desta forma, estende-se a fase “biossegura”, nos raceways, e cultiva-se os juvenis até a despesca, a partir de 4,5 g, em sistemas mais extensivos e com menor risco.

 

Variações nos diferentes sistemas de cultivo

Existem diferentes manejos e estratégias que podem ser empregadas na fase de berçários e raceways e que são aprimoradas constantemente, a partir da experiência prática dos técnicos que estão à frente da operação.

Convencionalmente, berçários intensivos são preconizados com taxas elevadas de trocas de água (5- 30%/dia) a fim de controlar a rápida elevação dos sólidos suspensos totais (SST) e dos compostos nitrogenados tóxicos na água. Por outro lado, elevadas trocas de água implicam em maiores custos com bombeamento, além de aumentar a possibilidade de contaminação.

Neste sentido, estruturas em estufas e/ou sombrites (Figura 9) com manejos mais aprimorados visando a estabilidade e o controle dos parâmetros da qualidade de água, como os sistemas de bioflocos (BFT) ou de recirculação de água (RAS, na sigla em inglês) têm cada vez mais chamado a atenção dos carcinicultores brasileiros.

Os sistemas de BFT ou RAS diminuem consideravelmente a necessidade de trocas de água e possibilitam uma maior biossegurança nos cultivos.

 

Considerações Finais

Nos três artigos publicados desta série, tivemos a oportunidade de transmitir aos leitores da Revista Aquaculture Brasil as últimas tendências no cultivo intensivo de PL´s e juvenis de L. vannamei no Brasil e no mundo.

Devido à necessidade constante dos carcinicultores em aprimorar seus cultivos, a fim de aumentar a biosseguridade, a estabilidade dos parâmetros de qualidade de água e, consequentemente, o aumento da produtividade, a aplicação das tecnologias aqui discutidas pode representar um passo importante para a recuperação da carcinicultura marinha brasileira.

Esperamos que em breve novas páginas da aquicultura brasileira possam ser escritas, mostrando cada vez mais a aplicação de novas tecnologias para a produção sustentável não somente de camarões, mas também de peixes e outros organismos aquáticos.

 

Autores: 
Bruno Ricardo Scopel
Eco Marine Aquicultura
scopel@ecomarinebr.com
Anízio Neto da Silva
Aquacultura Integrada Ltda
anizio@aquaculturaintegrada.com.br

 

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