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01 de Abril de 2018 Aquaculture Brasil
Dieta peletizada para engorda de polvo: inovação na aquicultura marinha

O polvo Octopus vulgaris é a principal espécie de polvo de importância econômica e considerada emergente para a diversificação da aquicultura marinha mundial. O aumento considerável no consumo de polvo nas últimas décadas e o valor comercial bastante atrativo (10 a 14 dólares/kg) associados às altas taxas de crescimento e eficiente conversão alimentar do O. vulgaris, tem despertado cada vez mais o interesse pela criação desta espécie.

Historicamente, O. vulgaris era descrito como uma espécie cosmopolita. Contudo, um estudo recente demonstrou que se trata, na verdade, de diferentes espécies (Amor et al., 2017). Este é o caso do “Octopus vulgaris do Brasil” que, atualmente, está classificado como Octopus vulgaris Tipo II (Figura 1) e em breve será redescrita como uma nova espécie. O polvo O. vulgaris Tipo II aceita bem alimento vivo e congelado, tem eficiente conversão alimentar e sua engorda em pequena escala pode ser uma fonte alternativa de renda ao maricultor (Bastos et al., 2014).

Apesar do potencial aquícola e mercadológico, uma das principais problemáticas para viabilizar a criação comercial de polvos é a ausência de dietas peletizadas ou extrusadas que promovam sobrevivência e crescimento adequados. Os polvos são carnívoros, tem baixa capacidade de digerir carboidratos e utilizam a proteína como principal fonte de energia (Lee, 1994). Na engorda industrial do O. vulgaris, a qual é realizada na Espanha, indivíduos capturados no ambiente natural são alimentados com espécies marinhas de baixo valor comercial, em sistema intensivo (Garcia-Garcia et al., 2014). Nesse sistema, polvos com peso mínimo inicial de 750 g podem alcançar até 3500 g no período de 90 a 120 dias, com 80 % de sobrevivência. Contudo, altos níveis de proteína na dieta e a dependência do alimento natural aumentam os custos de produção, comprometendo a viabilidade econômica da criação. Estima-se que a utilização de dietas artificiais em substituição ao alimento vivo ou natural para polvos possa diminuir os custos de produção em até 80 % (Hanlon et al., 1991). Portanto, é imprescindível obter dietas adequadas para aumentar a produtividade e viabilizar a engorda.

 

Dietas para polvos

Antes de formular uma dieta para polvos, é importante considerar que eles têm uma forma bastante particular de se alimentar. Possuem células receptoras nos braços, nas ventosas e na boca que lhes permitem reconhecer diferentes estímulos e identificar com precisão o tipo de alimento. Diferentemente dos peixes, o alimento para polvos não necessita ser limitado ao tamanho da boca. O polvo é capaz de segurar o alimento com os braços (Figura 2) e leva-lo até a boca onde é cortado com auxílio do bico, antes de ser ingerido. Assim, além de atrativa e palatável, é importante que a dieta formulada seja firme e coesa o suficiente para que seja ingerida sem se despedaçar. O conhecimento da dinâmica digestiva também é importante para formulação de dietas eficientes para polvos, pois permite determinar a habilidade destes animais para absorver e assimilar nutrientes.

Os principais fatores nutricionais que influenciam no crescimento e sobrevivência dos polvos são o tipo de processamento da dieta e a fonte proteica (Rosas et al., 2013). Dietas formuladas com ingredientes processados em altas temperaturas ( 100 °C) têm promovido baixas taxas de crescimento ou até mesmo perda de peso dos animais. Isto ocorre porque a proteína processada a ≈ 100 °C não é bem digerida pelos polvos e, consequentemente, afeta seu crescimento. Isto explica porque, atualmente, as dietas formuladas mais eficientes para polvos são aquelas com ingredientes secos à frio (liofilização) com taxas de crescimento de 3,04% peso corporal dia-1 (Martínez et al., 2014). Porém, a liofilização é um processo oneroso e depende de equipamento especializado, o que inviabiliza a transferência de tecnologia da criação em nível experimental para produção em larga escala. Por esta razão, conseguir produzir dietas peletizadas ou extrusadas nutricionalmente adequadas e aplicáveis à produção comercial é um passo importante para desenvolver a criação de polvos.

 

 

Avanços na nutrição de polvos: dieta peletizada

Com o objetivo de elaborar a primeira dieta peletizada para engorda de O. vulgaris Tipo II, foram realizados dois experimentos no Departamento de Aquicultura (UFSC). No primeiro, avaliamos a capacidade digestiva dos polvos quando alimentados com siri in natura. Constatamos que o O. vulgaris Tipo II utilizou a proteína como principal fonte de energia, assim como observado em outras espécies de polvos. O tempo para a digestão completa do siri foi de 6,5h à temperatura de 20 °C, quando o sistema digestório do polvo estava pronto para iniciar uma nova refeição. Estes resultados são importantes para estabelecer a frequência alimentar na fase de engorda nesta temperatura.

Com base nestas informações obtidas, foram formuladas duas dietas:

i) Dieta peletizada (dieta teste) processada por secagem a 40 °C contendo farinha de mexilhão Perna perna e farinha de siri Callinectes sp. secas também à 40 °C (Figura 3);

ii) Dieta semi-úmida (dieta controle) formulada com os mesmos ingredientes, porém, mantidos na forma crua (Figura 4). Os polvos (n=08) foram alimentados duas vezes ao dia à saciedade aparente por 25 dias, em laboratório. Como resultado, a dieta peletizada teve excelente aceitação pelos polvos, sendo ingerida logo após ser ofertada.

A dieta peletizada também apresentou alta estabilidade na água (95%) em relação à dieta semiúmida (75%). As vantagens da dieta peletiza são a maior praticidade na fabricação da dieta e no manejo alimentar, além de maior facilidade de armazenamento.

A taxa de sobrevivência foi de 100%. Embora a ingestão de dieta semiúmida tenha sido o dobro (40 g dia -1) em relação à ingestão da dieta peletizada (20 g dia -1), as taxas de crescimento foram similares nos polvos alimentados com ambas as dietas.

Estas são as primeiras informações sobre nutrição de polvos no Brasil e representam um importante passo para viabilizar a criação de polvos.

O ganho em peso médio diário foi de 3,9 g dia -1 para os polvos alimentados com a dieta peletizada e de 4 g dia -1 para os polvos alimentados com a dieta semiúmida. Esses resultados demonstram a eficiência da dieta peletizada, isto é, os polvos necessitam ingerir menor quantidade da dieta peletizada para obter o mesmo crescimento e sobrevivência em relação aos polvos alimentados com a dieta semiúmida.

Apesar do pequeno número de animais avaliados devido à grande dificuldade de obter polvos do ambiente em boas condições, estas são as primeiras informações sobre nutrição de polvos no Brasil e representam um importante passo para viabilizar a criação de polvos.

 

Conclusão

A dieta peletizada com siri e mexilhão processados a 40 ºC pode ser utilizada como ponto de partida para elaboração de rações para polvos. Além disso, a farinha de siri e farinha de mexilhão são ingredientes potenciais a serem utilizados na elaboração de dietas para engorda de polvos e outras espécies aquícolas.

 

Autores: Penélope Bastos, Débora Machado Fracalossi
Laboratório de Nutrição de Espécies Aquícolas – LABNUTRI
Departamento de Aquicultura, Universidade Federal de Santa Catarina
* penelopebastos@gmail.com

Carlos Rosas
Unidad Multidisciplinaria de Docencia e Investigación,
Facultad de Ciencias, Universidad Nacional Autónoma de México, Yucatán, México

Felipe do Nascimento Vieira
Laboratório de Camarões Marinhos – LCM,
Departamento de Aquicultura - Universidade Federal de Santa Catarina

 

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