Artigos
Tecnologia do Pescado
01 de Fevereiro de 2018 Aquaculture Brasil
Kafta de camarão: alternativa de novos produtos à base de pescado

O abastecimento mundial de pescado tem crescido constantemente nas últimas décadas, superando o crescimento da população mundial; e com o aumento gradativo da população mundial, a necessidade em desenvolver novos produtos à base de pescado tornou-se uma atividade cada vez mais explorada.

Como alternativa para favorecer o consumo e atribuir a importância do pescado na alimentação, a cada dia, novos produtos estão sendo elaborados usando como matéria-prima, o pescado. E, um modo de estimular esse consumo, é inovando em novos produtos e inserindo-os no mercado consumidor de forma estratégica, como a kafta de camarão, objeto do presente estudo, que trata-se de um produto alimentício de influência árabe, que evidencia a intensidade em seus condimentos (característico desse produto), e inclui um tipo de pescado com aceitação de mercado bastante ampla, como o camarão marinho de cultivo.

 

Materiais e métodos

Como grande parte dos consumidores desconhecem ou não tem o hábito de consumir a kafta, decidiu-se desenvolver a kafta tradicional e a kafta de camarão (Figura 1) como forma de comparação na análise sensorial.

A primeira etapa consistiu na pesagem da carne bovina (cálculo do rendimento), seguido da moagem e refrigeração (5ºC). Os camarões (Litopenaeus vannamei), obtidos na empresa Pescados Litoral Leste, localizada em Aracati (CE), foram acondicionados em caixas isotérmicas (gelo 1:1), transportados para o Laboratório de Tecnologia e Controle de Qualidade do Pescado (LAPESC/UFERSA) em Mossoró (RN), lavados, pesados, descascados, lavados novamente, realizada a moagem, embalados a vácuo, e mantidos sob refrigeração (5°C) até o início do desenvolvimento do produto.

Na segunda etapa foi feita a separação e pesagem dos condimentos (sal, cebola, alho, salsa, hortelã, azeite, pimenta síria, tripolifosfato de sódio e glutamato monossódico). Em seguida, as carnes moídas foram misturadas primeiramente com NaCl (extração das proteínas miofibrilares, solúveis em solução salina e as principais responsáveis pela liga da carne, firmeza e estabilidade à massa) seguido dos demais ingredientes até a completa homogeneização.

A terceira etapa consistiu no descanso da massa sob refrigeração (5ºC – 8h), seguido do porcionamento (100g), moldagem (cilíndrica no palito) e armazenamento sob refrigeração (5ºC) até o momento das análises físico-químicas e sensorias.

A quarta etapa consistiu do teste de cozimento (tempo de cozimento) em forno (230°C) por 30 minutos (até atingir a temperatura interna de 75°C - Figura 2).

 

 

Análises

Os camarões foram pesados após cada etapa do processamento (inteiro, descabeçado, descascado, moído), após a incorporação dos ingredientes, e durante o porcionamento da kafta, para o cálculo do rendimento. Amostras do camarão in natura, da massa da kafta crua e da kafta assada, foram avaliadas físico-química e microbiologicamente de acordo com metodologia oficiais. As kaftas foram também avaliadas sensorialmente com provadores não treinados (n= 50), utilizando o Teste de Diferença do Controle ABNT-NBR 13526 para avaliar se existe diferença entre a kafta de camarão quando comparada a kafta tradicional. Utilizou-se também o Teste de Aceitação Global com escala hedônica estruturada em nove pontos que variam desde “gostei muitíssimo” até “desgostei muitíssimo” para avaliar a aceitação da kafta de camarão. O índice de aceitabilidade foi calculado considerando como 100% o máximo de pontuação alcançada pelas diferentes formulações testadas na pesquisa e o critério de decisão para o índice ser de boa aceitação é no mínimo de 70%. Foi avaliada ainda a intenção de compra em relação ao produto desenvolvido (kafta de camarão) utilizando o Teste de Escala de Atitude estruturada em sete pontos que variam de “compraria sempre” até “nunca compraria”. Por final, foi feita a análise de custo baseado nos valores comerciais de cada ingrediente.

 

Resultados e discussão

O descabeçamento do camarão gerou 36,5% de resíduo (rendimento de 63,5%). Isto é esperado principalmente devido a anatomia do camarão, pois suas vísceras estão localizadas na cabeça, sendo o corpo composto apenas de músculo. A etapa do descasque apresentou rendimento de 83,5%, maior que o descabeçamento, em que nesta etapa há a retirada do exoesqueleto, que somados os dois processos serão gerados 47% de resíduos (média encontrada na literatura ~50%). Na etapa de moagem o rendimento foi de 82,1% (perda de 9,5% - carne retida no equipamento de moagem). O produto final (kafta) apresentou um ganho de peso de 117,2 % devido à incorporação de ingredientes na massa, com rendimento final de 5 kaftas com 100g.

Os custos com a matéria-prima e insumos foram calculados de acordo com seus valores comerciais. A estimativa de custos sobre o camarão foi de R$ 20,84/kg de produto pronto, indicando um baixo custo de produção, R$ 2,08/kafta contendo 100g cada, sendo esta uma boa porção individual por pessoa, viabilizando assim sua comercialização.

Os resultados das médias da análise físico-química do camarão in natura e da kafta crua e da kafta assada estão representados na (Tabela 1). Observou-se variação significativa no teor de umidade entre todos os tratamentos. A proteína apresentou-se maior no camarão in natura (24%), do que na kafta crua (11,49%) e na kafta assada (13,53%). Quanto aos teores de cinzas, o camarão in natura obteve um valor inferior de 1,05%, quando comparado com a kafta crua com 4,3% e a kafta assada com 4,52%, observando aqui um aumento na quantidade do mesmo, devido à incorporação principalmente de sais (NaCl) durante a produção da kafta. Os lipídios não obtiveram variação significativa, apresentando 3,36% no camarão in natura, 3,91% na kafta crua e 5,33% na kafta assada. Na análise dos cloretos, entre os tratamentos apenas o camarão in natura apresentou uma diferença significativa com menor valor de 0,029%, em relação a kafta crua com 0,209% e a kafta assada com 0,169%, sendo justificado pela adição de NaCl durante o desenvolvimento do produto kafta. 

Nas análises de frescor (pH, N-BVT e TMA), não houveram diferenças significativas entre os resultados nos diferentes produtos (camarão in natura, kafta crua e kafta assada), estando de acordo com os limites exigidos pela legislação brasileira, demonstrando alto frescor.

A legislação brasileira não indica limites para contagem de mesófilos e psicrófilos para o pescado, porém a presença desse tipo de microrganismo serve como referência para mostrar a capacidade de deterioração microbiana de pescado, que reduz a sua vida útil, mesmo a baixas temperaturas. Valores superiores a 106 UFC/g na carne do pescado são considerados críticos com relação ao grau de qualidade, e a população de microrganismos aeróbios no pescado destinados ao consumo humano não devem ser superiores a 107 UFC/g. Os valores de mesófilos com 200 UFC/g presentes na amostra de kafta crua, está dentro dos padrões estabelecidos. Todos os valores encontrados para coliformes termotolerantes, Staphylococcus e Salmonella no camarão in natura, na kafta crua, estão abaixo dos limites estabelecidos pela legislação. Dessa forma, os resultados das análises microbiológicas só comprovam que o produto desenvolvido, kafta de camarão, durante as etapas de sua produção seguiu devidamente todos os processos e obtenção de qualidade das matérias-primas utilizadas para elaboração da mesma, inserindo as boas práticas de fabricação, oferecendo assim, um produto final com qualidade e segurança alimentar para o consumidor.

Na análise realizada pelo teste de diferença do controle, 12% afirmaram que a kafta de camarão estava extremamente melhor comparada ao controle, 68% relataram que o produto de camarão era muito melhor que o controle, e 8% afirmaram que este era regularmente melhor que o controle, e 10% que a kafta seria ligeiramente melhor que o controle, apresentando um grau de aceitabilidade bastante variável e com resultados elevados. Foi extremamente baixo o percentual derejeição, com apenas 2% dos julgadores considerando este produto ligeiramente  pior que o controle, e as demais opções de rejeição como regularmente, muito pior e extremamente pior que o controle não apresentaram nenhum valor percentual. No Teste de Aceitação Global (aceitabilidade da kafta de camarão) os resultados das notas não apresentaram diferença significativa entre os sexos, em que o maior valor médio foi o feminino (7,79 ± 0,71) e o menor médio foi masculino (7,42 ± 0,97), em relação à média de nota atribuída pelo sexo masculino, na qual se tratavam de 42% de julgadores do sexo feminino e 52% do sexo masculino. Apenas 2% dos julgadores declaram que provavelmente não comprariam este produto, e 10 % enfatizam que talvez compraria/ou não compraria, totalizando 12% de incerteza quanto a intenção de compra e consumo deste produto, embora demonstrando ainda que a aceitabilidade e intenção de compra foi superior com 34% declarando que provavelmente comprariam o produto e 54% afirmando que certamente comprariam o produto, somando assim 88% de aceitabilidade de uma forma geral, o que pode ser confirmado pelo índice de aceitabilidade (IA = 84,4%) do produto.

 

Conclusão

Os resultados permitiram afirmar que a kafta de camarão se mostrou um produto de grande potencial (alto índice de aceitabilidade), que acompanha as mudanças do consumidor contemporâneo.

A kafta de camarão apresenta-se como um produto com alto valor nutricional, inovador, e principalmente, prático e rápido em seu preparo, tonando-se mais uma alternativa de produto à base de pescado, que pode atuar quanto ao incentivo de consumo do mesmo, atraindo o consumo por ser um produto novo, diferenciado dos demais existentes no mercado e por possuir influências de outras culturas, nesse caso, a árabe.

O custo estimado da kafta de camarão indica que sua elaboração pode ser viável, necessitando de um estudo de viabilidade econômica mais aprofundado, a fim de que futuramente esse produto possa ser comercializado.

 

Autores: Prof. Dr. Alex Augusto Gonçalves
Chefe do Laboratório de Tecnologia e Controle de
Qualidade do Pescado (LAPESC)
Centro de Ciências Agrárias (CCA)
Departamento de Ciências Animais (DCA)
Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA)
Mossoró, RN, Brasil
alaugo@gmail.com

Fernanda Juliane Alves de Paiva
Engenheira de Pesca, LAPESC/DCA/CCA/UFERSA
Mossoró, RN, Brasil
fernandajuliane.paiva@hotmail.com

 

Faça o download e confira o texto completo com todas as ilustrações. Clique aqui
 

Anterior
Próxima

+55 (48) 9 9646-7200

contato@aquaculturebrasil.com

Av. Senador Gallotti, 329 - Mar Grosso
Laguna - SC, 88790-000

AQUACULTURE BRASIL LTDA ME
CNPJ 24.377.435/0001­18

Top

Preencha todos os campos obrigatórios.

No momento não conseguimos enviar seu e-mail, você pode mandar mensagem diretamente para contato@aquaculturebrasil.com.

Contato enviado com sucesso, em breve retornamos.

Preencha todos os campos obrigatórios.

Preencha todos os campos obrigatórios.

Você será redirecionado em alguns segundos!