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Cultivo de Camarões
17 de Março de 2020 Aquaculture Brasil
Introdução e desenvolvimento da criação do camarão marinho Litopenaeus vannamei realizada por agricultores familiares do semiárido pernambucano

O camarão marinho é bastante apreciado em todo mundo. Sobretudo, seu consumo tende a ser maior nas regiões litorâneas, devido a um maior mercado consumidor e a maior
oferta, já que as fazendas produtoras de camarão marinho, na sua grande maioria, são localizadas na faixa litorânea e próximas aos estuários, que tem grande influência de águas salinas. 

Por outro lado, no interior dos estados brasileiros, há um menor consumo de camarão marinho devido à baixa disponibilidade do produto fresco e até mesmo congelado. A produção em águas interiores ainda é pequena e não abrange todos os estados. Consequentemente a oferta desse produto nestas regiões é mais baixo, principalmente no Sertão nordestino.

Uma grande parte do Estado pernambucano está inserido no semiárido brasileiro e divide-se em duas regiões: Agreste e Sertão. Apesar do clima árido, a produção de alimentos representa a principal fonte de renda ou complementar de muitas famílias dessas duas regiões, limitada às condições ambientais adversas, a escassez de água, carência de informações tecnológicas e assistência técnica. Além disso, o costume e a tradição do agricultor, em praticar as mesmas culturas agropecuárias dos seus ancestrais, dificultam à aceitação e absorção de novas culturas e tecnologias, geradoras de renda.

 

 

O inicio do projeto

O Instituto Agronômico de Pernambuco – IPA é o órgão estadual de pesquisa, assistência técnica e extensão rural e de infraestrutura hídrica, que visa o desenvolvimento
rural prioritário dos agricultores de base familiar. No ano de 2010, através do instituto, fomos convidados à participar do “Programa Água Doce” do Ministério do Meio Ambiente – PAD/MMA, assumindo a Coordenação do Sistema Produtivo Integrado das Unidades Demonstrativas – UD´s a serem implantadas em Pernambuco.

Em 2012, a comunidade da Agrovila VIII, no município de Ibimirim, localizada a 320 km de Recife, não tinha fonte de água potável para beber. Assim, os agricultores familiares eram dependentes das águas de caminhões pipa, enviadas por programas sociais ou emendas de políticos, a serem executadas pelos órgãos governamentais e não governamentais do município, Estado e Federação. Os poços existentes nas propriedades eram de água salobra, que dependendo do grau de salinidade, não eram ideais para plantio e nem tão pouco para a dessedentação do rebanho.

A partir de um diagnóstico socioeconômico e ambiental foi implantada uma UD neste município, que consistia em um sistema de produção integrado de forma sustentável por três subsistemas interdependentes. No primeiro, a água salobra é captada no subsolo, através de um poço tubular e enviada para um dessalinizador que produzia água potável, mas também um efluente bem mais concentrado de sais. No segundo subsistema, o efluente do dessalinizador (concentrado) era utilizado para o cultivo de tilápia (Oreochromis niloticus). No terceiro, o concentrado dessa criação, rico em matéria orgânica, é aproveitado para fertirrigação da erva-sal (Atriplex nummularia), que por sua vez é utilizada na produção de feno para alimentação de ovinos e caprinos da comunidade, fechando assim o sistema de produção ambientalmente sustentável (figura 1).

No decorrer da execução dos trabalhos, realizados na UD, fomos verificando que os ganhos financeiros do segmento da piscicultura, estavam muito abaixo do esperado. Então, em 2013, apresentamos uma proposta para a comunidade realizar, através da nossa orientação e apoio, um experimento em um dos tanques de peixes. O objetivo era agregar valor financeiro ao cultivo de tilápia, aumentando seu percentual de lucro, através da introdução do camarão marinho no mesmo tanque, realizando um policultivo.

Quando todos aceitaram a ideia, foi povoado um tanque com 3.300 juvenis de camarão Litopenaeus vananmei com peso médio de 1,9 g doados pelo Departamento de Pesca e Aquicultura da UFRPE. O tempo de transporte entre trajeto, Recife à Ibimirim, a aclimatação e o povoamento dos indivíduos, teve uma duração aproximada de 6 horas. O tanque utilizado no experimento tinha 360 m2 e já vinha sendo realizado 77 dias de cultivo de 1.500 tilápias, com peso médio de 98 g, sendo povoadas inicialmente com 2 g.

A alimentação era fornecida às tilápias 3 vezes ao dia com ração extrusada e os camarões se aproveitavam das sobras de ração, matéria orgânica e o alimento natural do ambiente. Havia um aerador chafariz para suprir as maiores demandas por oxigênio, quando necessário.

 

Resultados

Os parâmetros de qualidade de água, oxigênio, pH, condutividade elétrica, transparência e temperatura foram acompanhados pelos agricultores e se mantiveram dentro dos padrões aceitáveis para as espécies, e a salinidade média ficou em 12 ppt.

Durante o cultivo, a necessidade de renovação de água diminuiu em relação aos monocultivos de tilápia realizados anteriormente. A despesca foi realizada após 182 dias de cultivo da tilápia, correspondendo a 105 dias do camarão marinho, que atingiram um peso médio, respectivamente de 597 g e 18 g.

No policultivo, geralmente, o povoamento dos camarões é realizado alguns dias antes de povoar com a tilápia, mas surpreendentemente, os dados produtivos obtidos nessa experimentação de campo, principalmente a sobrevivência de 98% mostram que a introdução do camarão marinho juvenil numa fase inicial do cultivo de tilápia teve um grande êxito. Além do lucro final da tilápia ter aumentado 74% com a venda do camarão, este proporcionou melhores condições ambientais, através do consumo da matéria orgânica e diminuiu a necessidade de bombeamento para renovação de água, reduzindo também, o consumo de energia.

 

Conclusão

A partir dos resultados alcançados e pesquisas literárias realizadas podemos concluir que o cultivo de camarão marinho no semiárido apresenta algumas vantagens, como:

1. Aproveitamento dos poços com águas salobras e das áreas com solo em processo de degradação ou áreas desertificadas do Agreste e Sertão.

2. Falta camarão marinho no mercado local dos municípios do interior do estado, onde existe uma grande demanda.

3. Dependendo do sistema adotado, a quantidade de água consumida para se produzir um quilo de camarão é mínima em relação ao que é consumido nas demais atividades agropecuárias tradicionais, havendo perdas apenas por evaporação. O maior volume de água usada na carcinocultura, poder ser reaproveitado no próprio sistema de cultivo, no próximo ciclo, na agricultura, ou devolvido para a fonte hídrica.

4. O Fator de Conversão Alimentar (FCA) dos organismos aquáticos cultiváveis é o mais baixo de todas as espécies animais produzidas naquela região para alimentação humana, ou seja, gasta-se menos matéria orgânica seca para se produzir um quilo de carne.

5. A carcinocultura pode dar o mesmo retorno financeiro da piscicultura com um menor investimento inicial e custeio.

6. O interior apresenta ambiente inócuo, com menor possibilidade de ocorrer e transmitir as doenças, que vem prejudicando a carcinocultura marinha na zona litorânea, além de minimizar algum possível impacto ambiental.

7. Os valores imobiliários de muitas propriedades no interior com potencial para carcinocultura marinha são muito menores do que nas áreas no litoral.

 

Como esse trabalho foi pioneiro na região do Sertão Pernambucano e os nossos excelentes resultados foram bastante divulgados, apareceram várias caravanas de agricultores familiares, de estudantes universitários, de autoridades políticas e de gestores governamentais de outros municípios, conforme pode ser observado nas figuras 2, 3 e 4.

O cultivo ainda se extendeu para outros municípios do Estado de Pernambuco, são eles: Salgadinho (Figura 5), Vertentes, Gravatá, Passira e São Lourenço da Mata.

 

Autor: Gilvan Pais de Lira Júnior
Engenheiro de Pesca e Msc. em Aquicultura
Instituto Agronômico de Pernambuco - IPA
Extensionista Rural
Recife, PE
gilvan.lira@ipa.br

 

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