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Cultivo de Peixes
01 de Maio de 2017 Aquaculture Brasil
A produção do pintado amazônico em Mato Grosso

A expansão populacional e as pressões ambientais conduzem à necessidade, cada vez maior, de diversificação da oferta e aumento da produtividade de alimento. A demanda de alimento saudável é cada vez maior, o apelo dos médicos e nutricionistas indicam o consumo de pescado como forma de minimizar problemas de saúde. Em 2016 o consumo mundial de proteína de pescado ultrapassou os 18 kg per-capta/ano. A expectativa é que este consumo atinja 19,5 kg per-capta/ano em 2030. A demanda crescente é sustentada pela produção aquícola, já que o extrativismo está estagnado desde a década de 70. Os países com potencial para exploração da piscicultura são limitados pela disponibilidade de água com qualidade. O Brasil se prepara para assumir o posto de um importante produtor mundial pela grande vocação de produção, clima favorável, topografia adequada, água disponível, inúmeros barramentos de hidroelétricas, insumos para ração e o desenvolvimento de tecnologias para produção de peixes nativos.

Entre as duas espécies de peixes nativos mais produzidos no Brasil estão o tambaqui (Colossoma macropomum) e os surubins do gênero Pseudoplatystoma. Estes bagres possuem características muito importantes quando se fala em produtos de alto valor agregado como, por exemplo, o filé sem espinha intramuscular e o excelente rendimento de carcaça, superior a 40%. Entretanto, outros índices zootécnicos como crescimento, conversão alimentar, exigência nutricional, resistência a doenças e ao manejo, e o treinamento alimentar comprometem a produção em escala das espécies puras, em especial o cachara e o pintado.

A alternativa encontrada pelo setor produtivo para reverter esses problemas descritos acima foi a hibridação, ou seja, o cruzamento do cachara (Pseudoplatystoma reticulatum) com o jundiá amazônico (Leiarius marmoratus), resultando no pintado amazônico. Este nome mostrou-se muito adequado do ponto de vista de marketing visando a aceitação por parte do público.

 

Principais características do pintado amazônico

O pintado amazônico é um peixe com excelentes índices zootécnicos, como:
• Crescimento rápido;
• Baixo canibalismo comparado às espécies “puras” cachara e pintado, bem como seus híbridos;
• Bom rendimento de fi lé e ausência de espinhos intramusculares;
• Resistência a densidades elevadas e ao manejo;
• Menor exigência nutricional comparado aos demais cruzamentos similares.

 

Em 2016, somente no município de Sorriso/MT foram produzidas 12.000 toneladas de pintado amazônico e a expectativa é chegar a 20.000 toneladas em 2020. O setor industrial está estruturado e aposta em processar o pintado amazônico e concorrer com a tilápia na venda de filé sem espinha. Contudo, para que isto concretize- se, o foco deverá ser a pesquisa em melhoramento genético (das espécies parentais utilizadas no cruzamento – Macho de Pseudoplatystoma reticulatum x Fêmea de Leiarius marmoratus) e nutrição, além da produção de alevinos em grande escala para diminuir o custo e o desenvolvimento de novas tecnologias de produção. A estruturação de projetos eficientes, manejo adequado e gestão dos cultivos de pintado amazônico são detalhes que farão a diferença para o sucesso dos empreendimentos.

Neste sentido, para se aumentar a produção de peixes, pode-se ampliar a extensão da área de produção ou a produção por área. Maximizar e melhorar a utilização da água, utilizar peixes com alto potencial genético, controlar o ambiente e promover os manejos eficazes são, igualmente, alternativas que devem ser priorizadas.

 

Sistema de cultivo do pintado amazônico no Mato Grosso

O sistema mais utilizado na produção do pintado amazônico no Mato Grosso é o semi-intensivo, com produtividades que podem variar de 10 a 30 toneladas por hectare/ano.

A técnica consiste no cultivo do pintado amazônico em um ambiente altamente controlado, normalmente praticado em viveiros escavados. Nesse sistema, o produtor já se preocupa com adubação, renovação de água, dieta totalmente controlada e monitoramento diário da qualidade da água. O sistema empregado caracteriza-se por apresentar melhores rendimentos que o extensivo e permitir maior densidade (5.000 – 15.000 peixes/ hectare).

O processo produtivo em sistema semi-intensivo vai do “peixamento” a despesca, baseado no fluxograma e nas biometrias para adequação dos manejos de arraçoamento e controle de qualidade de água. O peixamento é realizado com alevinos que receberão dieta adequada, em quantidade e qualidade. Todo processo envolve o acompanhamento diário da qualidade da água, mensurando-se oxigênio dissolvido e a temperatura, adequação da quantidade de ração a cada semana até o final da engorda, e aferição semanal das características físicas e químicas da água (alcalinidade, pH, dureza, amônia, CO2, condutividade e transparência). Outros aspectos importantes dizem respeito a regulagem diária e limpeza de filtros da entrada e saída da água dos viveiros, além da observação e anotação diária do comportamento dos peixes durante o arraçoamento.

 

Densidades de cultivo

O número de peixes que poderá ser colocado nos viveiros dependerá de vários fatores como:
• Fase ou ciclo de produção (viveiro de alevinagem ou de engorda);
• Tamanho do viveiro;
• Sistema de produção que será utilizado (monocultivo, policultivo ou consorciado);
• Tempo em que se pretende concluir o cultivo;
• Qualidade e quantidade de água disponível;
• Tamanho do peixe estimado para o abate;
• Disponibilidade de renovação de água;
• Sistema de aeração artificial.

Em geral:
Com uma renovação média de 10 litros/ha/segundo em viveiros de engorda sem aeração, a densidade indicada é de 1 peixe a cada 2m², considerando o peso de abate de 2 kg. Em viveiros com renovação 10 litros/ha/segundo e uso de aeradores (1 aerador de 2 HP para cada 5.000m²) a densidade indicada é de 1 peixe para cada m², ou seja, 2 kg de peixe para cada metro quadrado (considerando o peso de abate de 2 kg).

 

 

Controle de predadores

Além de peixes, jacarés e aves também costumam constituir-se em um problema para algumas pisciculturas. Aves como os biguás (mergulhão), martim-pescador, garças e socós conseguem capturar não só peixes pequenos como também peixes maiores. Muitas vezes, mesmo não conseguindo capturá-los, as aves causam ferimentos que podem levar os peixes à morte.

O controle das aves predadoras é difícil, porque a legislação ambiental brasileira considera crime o abate de aves selvagens. Dessa forma, o meio mais prático de minimizar os efeitos da predação dessas aves sobre os peixes cultivados é espantando-as. Para isso, podem ser usados espantalhos, fogos de artifício ou qualquer mecanismo que produza barulho.

Uma alternativa eficiente para controlar os predadores é a utilização de fios de nylon monofilamento (100 mm) transpassados de um lado a outro do viveiro e amarrados em um cabo de arame liso que circunda o viveiro (Figura 1). Desta forma, pode-se conviver com os pássaros predadores sem problemas. Outros métodos como o uso de telas recobrindo todos viveiros também podem ser utilizados, mas o custo de instalação e manutenção ainda é alto, comparado a uso de fios de nylon.

 

Manejo de “canibais”

Além dos cuidados com os predadores, a fase inicial da criação do pintado amazônico é considerada crucial para o sucesso do cultivo, sendo necessário que todos os projetos de engorda de pintado amazônico tenham recria (pré-engorda). Os viveiros de recria obrigatoriamente necessitam ser bem dimensionados, indicando-se 10% da área total de engorda.

O formato dos viveiros deve ser retangular e possuir monge (comporta), estrutura para melhorar o manejo de qualidade de água, além de proteção antipássaro, descrito anteriormente. O formato retangular além de facilitar o manejo da qualidade de água favorece o manejo de classificação de canibais (são peixes que se destacam no crescimento inicial e possuem a característica de predar os peixes menores), que no caso do pintado amazônico é indispensável.

Geralmente as pisciculturas de pintado amazônico recebem dos laboratórios alevinos de 8 a 10 cm, pesando em média 8 gramas. Nessa fase ainda pode ocorrer canibalismo, portanto, após 30 dias do recebimento, o lote de alevinos precisa ser classificado, retirando-se todos os canibais. Após 2 a 3 meses os juvenis devem estar com 100 a 150 gramas e estarão prontos para engorda.

 

Viveiros de engorda

Os viveiros escavados para exploração do pintado amazônico na engorda são, em geral, retangulares e podem variar de tamanho conforme a topografia e disponibilidade de água. Viveiros que variam de 2 a 5 hectares são os mais indicados, e o formato retangular facilita o manejo. Recomenda-se viveiros de, no máximo, 100 metros de largura para facilitar a despesca e o manejo de arraçoamento (melhor distribuição da ração), além do manejo da qualidade de água (formato retangular facilita o direcionamento da água e da matéria orgânica para o monge). Outros modelos de viveiro são os barramentos de água. No Mato Grosso, muitas pisciculturas estão instaladas em ambientes impactados, ou seja, em áreas anteriormente degradadas para a construção de barragens. Estas áreas consistem de barramentos antigos, construídos na década de 80, e que hoje são explorados para produção do pintado amazônico. A estruturação desses ambientes permite a produção de pintado amazônico com eficiência e com baixo impacto na qualidade da água, conforme descrito a seguir.

 

Sistema semi-intensivo em barramentos (com monge auto-limpante)

O barramento consiste na estruturação de ambientes consolidados, caracterizando-se por barragens antigas construídas em pequenos riachos, as quais podem variar de tamanho (1 a 15 hectares) e aonde a produção pode chegar até 25 toneladas/ha/ciclo com uso de aeradores. A grande vantagem é o fato da topografia em formato de calha destinar toda a matéria orgânica produzida no sistema para o monge constantemente, não acumulando desta forma excessos no fundo do viveiro.

Especificamente em barramentos para cultivo do pintado amazônico, o monge estruturado tem permitido a manutenção constante da qualidade da água, atendendo às condições propostas pela resolução CONAMA N°430/2011. Em geral, a água que sai dos monges possui característica físico-química melhor do que a água que entra no barramento. A qualidade do efluente do monge auto-limpante contém baixa concentração de resíduos sólidos. Isto ocorre por dois principais motivos, o primeiro é que não existe acúmulo de matéria orgânica, tendo em vista que o formato em calha dos barramentos permite a condução constante dos sólidos gerados pelos peixes (Figura 2), da mesma forma que ocorre naturalmente nos córregos.

Para promover esse efeito de condução dos sólidos na calha do barramento, a vazão mínima de água deverá ser de 10 litros/ha/segundo, proporcionando a constante derivação dos sólidos gerados, sempre diluídos, não ocorrendo acúmulo residual dentro do barramento. O segundo motivo dá-se pela estruturação do monge auto-limpante que permite manejar constantemente a qualidade de água, melhorando consequentemente os parâmetros físicos e químicos, principalmente o pH. De acordo com a Resolução CONAMA anteriormente citada, o pH do efluente deverá estar sempre entre 5 e 9. O barramento com monge estruturado permite melhorar o pH, mantendo-o sempre acima de 6 e no máximo 8, que é a faixa ideal para o bom cultivo dos peixes. Naturalmente, o pH da água que entra nos barramentos no Estado do Mato Grosso está abaixo de 5, inferior ao estipulado pelo CONAMA e também diferente dos principais rios da região que o pH é 7.

Monge é uma estrutura de concreto e ferro armado com função de controlar o nível e escoamento da água em uma barragem ou em um viveiro de piscicultura (Figura 3). A estrutura obrigatoriamente localiza-se na porção mais funda, permitindo drenagem total da água.

 

Considerações Finais

• A produção do pintado amazônico no Mato Grosso busca atender o pré-requisito da sustentabilidade;
• O sistema semi-intensivo é o sistema mais explorado para a produção do pintado amazônico;
• As inovações dos sistemas de cultivo sempre estão relacionadas à melhoria e preservação da qualidade da água, pois a água faz parte do organismo do peixe e reflete diretamente no desempenho;
• A grande maioria dos sistemas de barramentos consiste no aproveitamento de ambientes já degradados, melhorando a qualidade de água e eliminando problemas de degradação ambiental;
• O monge auto-limpante em barramentos é uma estrutura que permite manter a qualidade de água constantemente do início ao fim do cultivo dos peixes.

 

Autores:

Darci Carlos Fornari
Bom Futuro Genética de Peixes, Cuiabá/MT
darci.peixegen@gmail.com

Ricardo Pereira Ribeiro
Professor Associado Programa de Pós-Graduação em Zootecnia
Departamento de Zootecnia – UEM
rpribeiro@uem.br

 

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