Artigos
Cultivo de Camarões
01 de Março de 2017 Aquaculture Brasil
A utilização de berçários e raceways em fazendas de camarão marinho Litopenaeus vannamei no Brasil

II – Desinfecção e fertilização

Em nosso primeiro artigo sobre o tema, publicado na 4ª edição da Revista Aquaculture Brasil (jan/fev-2017), abordamos questões gerais do histórico do uso dos berçários e raceways no Brasil, as diferentes estruturas que estão atualmente sendo utilizadas e as vantagens da implementação de sistemas bifásicos e trifásicos nas fazendas. No Brasil, apesar de um aumento significativo no interesse da aplicação destas tecnologias, trabalhos específicos sobre berçários e raceways em alta densidade ainda são escassos. Desta forma, pretendemos contribuir com informações técnicas importantes para a operação destas estruturas através de revisões de conceitos básicos e experiências práticas adquiridas nos últimos anos no Brasil.

 

Desinfecção da Água de Cultivo

Como em qualquer cultivo, o tratamento da água pré-povoamento tem uma elevada importância, principalmente na situação de brotes de doenças nas fazendas, onde deseja-se excluir por completo, ou ao máximo, os microrganismos patogênicos e seus vetores, como forma de biosseguridade. Assim, uma das vantagens na utilização de berçários é a possibilidade de um tratamento de água eficiente devido ao baixo volume de água a ser tratado. Barreiras físicas como telas (<500 micras) e filtros (<200 micras), bem como tanques de sedimentação e oxigenação, podem auxiliar como primeiro tratamento da água, eliminando boa parte de vetores dos patógenos e excesso de matéria orgânica, aumentando a eficiência dos tratamentos posteriores.

Tratamentos com raios ultravioletas (UV) são muito eficientes. A própria luz solar tem um poder muito forte sobre os microrganismos, principalmente quando o ambiente estiver seco (quando o tanque estiver vazio). Equipamentos de UV, muito utilizados para tratamento de água em larviculturas e hatcheries também podem ser implementados em sistemas de berçários nas fazendas, porém ainda não são equipamentos usuais nestes empreendimentos, principalmente devido ao preço de instalação quando necessita-se tratar grandes volumes de água.

Tratamentos químicos da água são muito comuns na aquicultura, entre eles destacam-se (Boyd & Tucker, 1998; Aldays-Sanz, 2010):

  • Hipoclorito de cálcio;
  • Hipoclorito de sódio;
  • Óxido de cálcio (cal virgem);
  • Hidróxido de cálcio (cal hidratada);
  • Amônia quaternária;
  • Gás ozônio;
  • Ácido fórmico;
  • Formalina;
  • Iodo;
  • Alguns tipos comerciais de crustacidas.

 

Em cultivos de camarão o hipoclorito de cálcio (65%) é o desinfetante mais comum. De forma geral se utiliza 10 ppm de cloro livre para a eliminação de bactérias e a maior parte de vetores, e 30 ppm de cloro livre para a eliminação de vírus, entretanto a utilização do cloro como desinfetante necessita de atenção em alguns
pontos.

Primeiramente, níveis bem baixos de cloro na água já são suficientemente tóxicos aos camarões, desta maneira a aplicação de cloro deve ser sempre feita antes do povoamento e com total segurança que não haverá cloro residual na água. O cloro é um radical que perde elétrons e começa a oxidar-se, ou seja, é um agente redutor. Em reação com a água forma um ácido forte (ácido clorídrico) e um ácido fraco (ácido hipocloroso ou HClO). O ácido hipocloroso (HClO) é o agente desinfetante e tem relativa facilidade em penetrar na parede celular.

Desta forma, o pH da água tem grande influência na eficiência de ação do cloro como desinfetante, pois dependendo do seu valor facilita a dissociação do ácido hipocloroso (HClO) nos íons H+ e OCl, entretanto, o OCl, apresenta um baixo poder desinfetante. Com estas características podemos então definir que o pH da água mais ácido aumenta a eficiência do cloro e em pH mais alcalino, o poder desinfetante do cloro diminui. O cloro residual livre oxida a matéria orgânica presente na água, perdendo seu poder de desinfecção, assim como o cloro residual em reação com a amônia formam as chamadas cloraminas, as quais são altamente tóxicas aos animais cultivados.

Resumidamente, quanto maior a quantidade de matéria orgânica na água, mais elevada a temperatura e maior o pH da água, menor o poder desinfetante do cloro, necessitando aplicações mais elevadas do produto para que sua eficiência na eliminação de patógenos seja satisfatória (Boyd & Tucker 1998; Barbieri & Ostrensky, 2001; Aldays-Sanz, 2010).

 

 

Fertilização e startup da água

Depois de cumprido todos os procedimentos de esterilização da água, deve-se dar início à fertilização, uma vez que comprovadamente águas ricas em produtividade natural, microalgas e zooplâncton, são mais adequadas ao crescimento de pós-larvas de camarão. Águas de abastecimento já fertilizadas (sem esterilização) ou com uso de inóculo de uma água utilizada em cultivo anterior, necessitaram menos ou nenhum tipo de fertilização inicial.

O conceito básico de fertilização é a aplicação de compostos inorgânicos à base principalmente de nitrogênio (N), fósforo (P) e potássio (K) para promover o crescimento de algas e de compostos orgânicos a base principalmente de carbono (C) e nitrogênio (N). Entretanto, todos os microrganismos necessitam de outros macro elementos, como por exemplo magnésio (Mg), potássio (K), enxofre (S), sódio (Na), cálcio (Ca), cloreto (Cl) e microelementos como ferro (Fe), manganês (Mn), zinco (Zn) etc. Estes elementos de forma geral estarão em quantidades suficientes na água de cultivo, principalmente em águas com maiores salinidades. Muitos produtores utilizam materiais à base de sílica (Si) para promover microalgas diatomáceas.

Uma fertilização adequada deve ser iniciada entre 4 a 10 dias antes do povoamento, dependendo das condições da água e do ambiente de cultivo, até que se atinja o bloom de microalgas desejado. Fatores como incidência luminosa, temperatura, pluviosidade, concentração total de nutrientes, biomassa estocada e tipo de fertilizante irão impactar fortemente na qualidade da fertilização inicial. Uma água está pronta para o povoamento quando sua transparência fica entre 35-50 cm, aferida com disco de Secchi, mas somente se a turbidez da água estiver composta basicamente por microalgas e zôoplancton, uma vez que compostos inorgânicos argilosos podem interferir na leitura da transparência.Um microscópio pode ser usado para se ter uma melhor segurança no que está compondo a turbidez da água.

Na presença de luz, o fitoplâncton será o primeiro grupo de microrganismos a crescer e a predominar no sistema, em qualquer tipo de cultivo, salvo em sistemas realizados sem luz, o que inibe a fotossíntese. O crescimento de microalgas pertencentes aos grupos Clorophyta e Chrysophyta (diatomáceas) na água no início dos cultivos é extremamente benéfico não só para a nutrição, mas para uma boa manutenção da qualidade de água, controle inicial da amônia e como base para uma cadeia microbiana benéfica e saudável. Com o passar dos dias, com a entrada de nutrientes através de fertilizantes orgânicos e ração, bactérias heterotróficas, bactérias quimioautotróficas (nitrificantes) e zôoplancton em geral, começam a crescer e se multiplicarem na água. Em sistemas intensivos e superintensivos com baixa troca de água, há uma tendência das bactérias predominarem o sistema inibindo o domínio das microalgas, numa mudança de sistema fotoautotrófico para sistema bacteriano.

Essa dinâmica microbiológica é de fato muito importante para a manutenção de qualidade de água e está fortemente relacionada com a fertilização inicial e controle dos parâmetros físicos e químicos da água.

 

Quantidade de fertilizantes na aplicação

A quantidade de fertilizantes utilizada em tanques berçários e viveiros de camarão não pode ser padronizada como “receita de bolo”, afinal cada ambiente e qualidade de água reagirá de uma forma diferente. Concentrações altas de cálcio causarão precipitação do fósforo, inibindo seu poder de fertilização, assim como águas com baixa alcalinidade (< 80mg/L CaCO3) serão mais limitadoras na ação dos fertilizantes. Desta maneira, a visualização do efeito dos fertilizantes sobre a água e a experiência do técnico que está operando o sistema ajudarão no refinamento das práticas de fertilização, assim como a criação de protocolos específicos para cada condição.

Organismos marinhos têm uma relação 106:16:1 de carbono, nitrogênio e fósforo, respectivamente. Relações N:P (Nitrogênio:Fósforo) para promover bloom de microalgas têm sido relatadas por diferentes especialistas entre 2:1 até 16:1, dependendo de quanto a água já disponibiliza destes nutrientes e o quanto eles farão o efeito desejado na água. As frequências de aplicação variam de 1 vez por semana até a cada 2-3 dias. As relações de C:N utilizadas para a promoção e bactérias variam de 6:1 até 20:1.

Melaço de cana contém cerca de 0,3 kg (30%) de carbono/kg de melaço e suas aplicações normalmente são acompanhadas do probióticos. Quantidades de 10-50g/ m3 de melaço têm sido utilizadas para fertilização inicial. As frequências podem ser 1-2x/semana ou diárias até o povoamento. Dependendo do tempo disponível para as fertilizações. Ressaltando que aplicações elevadas de melaço reduzem consideravelmente as concentrações de oxigênio e aumentam a quantidade de matéria orgânica na água.

 

Conclusão

Os protocolos de tratamento e fertilização para berçários e raceways são variados e são ajustados conforme cada situação, tipo de cultivo, tempo disponível para a fertilização e a qualidade de água presente. As recomendações descritas neste artigo podem servir de base para que cada operador do sistema de cultivo faça sua “receita de bolo” conforme a observação de resultados e experiência prática.

 

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