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Piscicultura
01 de Outubro de 2016 Aquaculture Brasil
Quantos peixes tem no mar?

Quantos peixes tem no mar? Isto eu não sei dizer, mas posso garantir que são bem mais numerosos que a quantidade de empreendedores que se dedicam a cultivá- los. Durante o AQUACIÊNCIA deste ano, em Belo Horizonte (MG), estávamos discutindo a situação da piscicultura marinha no Brasil – área que dedicamos nossa vida profissional há mais de uma década. Resolvemos então escrever este artigo para apresentar os resultados do estudo que fizemos recentemente no litoral norte do Estado de São Paulo. Durante este trabalho visitamos e entrevistamos os piscicultores marinhos buscando conhecer quem são, o que fazem e quais suas necessidades e expectativas.

Nossa pesquisa começou por meio de visitas a todos os empreendimentos nos quatro municípios (São Sebastião, Ilha Bela, Caraguatatuba, Ubatuba). Este estudo é bem amplo e será aqui apresentado de forma muito resumida onde pretendemos apenas apontar os principais pontos que nos levaram à interessantes conclusões.
Nosso objetivo inicial era ter uma noção atualizada e exata desta cadeia produtiva com vistas ao desenvolvimento de um programa de pesquisas voltado ao atendimento das necessidades destes produtores.

Este tipo de planejamento de pesquisas não é muito comum no Brasil, entretanto, em outros países sempre está associado ao sucesso de cadeias produtivas onde a academia e a iniciativa privada caminham juntas.

 

 

Quem são os criadores?

Temos menos de dez empreendimentos cultivando peixes marinhos no Brasil. A quase totalidade deles está no Litoral Norte Paulista. Nesta região os criadores de peixes marinhos podem ser caracterizados como pessoas físicas, ou empresas de pequeno porte com baixo nível de governança corporativa.

A maioria dos produtores reside no município onde o cultivo está localizado, tem escolaridade de nível superior e idade média superior a 40 anos.
Todos os produtores possuem outra fonte de renda, sendo que a maioria dos cultivos até o momento contribui muito pouco para renda mensal do produtor.

 

Área de cultivo, profundidade e volume das gaiolas

As áreas de cultivo são de pequeno porte (inferiores a 20.000 m2), em sua totalidade localizadas em áreas abrigadas com baixa profundidade (inferior a 20 metros). As estruturas de cultivo são constituídas por tanques de PEAD (polietileno de alta densidade) com diâmetro entre 5 e 16 metros. O volume total dos empreendimentos raramente ultrapassa 1000 m3 e a densidade utilizada varia entre 5 e 15 kg/m3. O pequeno porte dos cultivos demanda poucos postos de trabalho, 70% deles operam com menos de três funcionários. Dos quatro municípios, apenas Caraguatatuba não possui empreendimentos de piscicultura marinha.

Por outro lado, o município de São Sebastião é o que apresenta o maior esforço em políticas públicas para fomentar esta cadeia produtiva.

 

Espécie cultivada

A única espécie cultivada comercialmente de peixe marinho no Brasil é o bijupirá (Rachycentron canadum). Porém, outra espécie é comercializada pela Redemar Alevinos, em Ilhabela/SP, que é a garoupa-verdadeira (Epinephelus marginatus). Algumas outras espécies são disponibilizadas por laboratórios de universidades ou instituições de pesquisa, mas ainda não tiveram seus cultivos implantados em nível comercial. Desta forma, o empreendedor fica muito limitado a atuar dentro de um sistema de monocultivo com todos os problemas advindos deste tipo de prática.

 

Laboratórios

Atualmente existem apenas dois laboratórios privados em todo o Brasil que comercializam formas jovens de bijupirá. Ambos localizam-se no Litoral Norte do Estado de São Paulo. Os laboratórios possuem uma razoável capacidade de produção, entretanto, operam muito abaixo de sua capacidade por falta de demanda.

 

Ração

A ração é um dos principais componentes do custo de produção de peixes marinhos, sendo motivo de grande preocupação para os produtores. Adquirida por preços elevados e com qualidade nem sempre adequada para as exigências nutricionais do bijupirá, os produtores vêm buscando alternativas na dieta para conseguir reduzir os custos na engorda e elevar a sobrevivência dos lotes. Por exemplo, alguns produtores utilizam pescado oriundo da pesca extrativa (sardinhas ou fauna acompanhante da pesca de arrasto do camarão). Embora estudos recentes estejam indicando melhores composições nutricionais para a dieta do bijupirá, ainda existe uma longa distância entre as pesquisas e a realidade disponível ao criador.

 

Licenciamento ambiental

O licenciamento ambiental é considerado um dos maiores limitantes da cadeia produtiva. Na região avaliada, apenas um único empreendimento está em vias de obter o licenciamento ambiental. A quase totalidade dos empreendimentos apenas dispõe de um protocolo junto ao extinto MPA (Ministério da Pesca e Aquicultura). O licenciamento junto ao órgão ambiental estadual (no caso do estado de São Paulo é a CETESB) é impossibilitado quando o interessado não possui o termo de cessão da área aquícola que é concedido pelo SPU (Serviço de Patrimônio da União). Porém, para o órgão licenciador ambiental a dominialidade da área é premissa básica para a análise do processo de licenciamento. Desta maneira, praticamente todos os empreendimentos trabalham com insegurança jurídica ficando desprovidos de acessar linhas de crédito ou programas de seguro.

 

Outros desafios

Todos os produtores consultados apontam a nutrição dos bijupirás como um dos maiores gargalos da atividade. Outros problemas como doenças e a dificuldade de obtenção de formas jovens também foram apontadas pelos produtores. Furtos e vandalismos são comuns à grande parte dos produtores que se queixam da insegurança que os cultivos ficam submetidos.

Um fato curioso é que a despeito de todos os problemas e desafios de uma atividade exercida em ambiente adverso com elevado grau de risco e complexidade, a totalidade dos empreendedores reportou nunca ter cogitado desistir da atividade. Este depoimento final consolida o perfil do empreendedor desta cadeia produtiva.

Curiosa a pergunta que nos leva à reflexão: o que mantém tantos empreendedores dedicados à uma atividade com tantos fatores desfavoráveis? Promessa de lucratividade no futuro? Faria pouco sentido acreditar em uma resposta tão superficial. Nosso convívio com estas pessoas nos levou a uma profunda admiração pelo senso de desprendimento que os unia. Parece a existência de uma crença inabalável de que a atividade de criação de peixes marinhos poderá se tornar muito em breve uma cadeia produtiva que modificará o cenário nacional. Tal crença, raramente reportada para empresários que no conceito popular somente se preocupam com o lucro imediato, assemelha-se à observada junto aos cientistas que dedicam seu tempo no estudo de técnicas de cultivo de peixes marinhos. Mesmo enxergando que os resultados práticos destes estudos estejam muito longe de se tornarem viáveis, todos continuam se esforçando para que essa cadeia produtiva se desenvolva.

Queremos agradecer a todos os corajosos criadores de peixes marinhos do Litoral Norte Paulista. A dedicação de vocês é que tornará nossa cadeia produtiva uma realidade o cenário brasileiro.

 

Autores: Eduardo Gomes Sanches* & Vanessa Villanova Kuhnen
Instituto de Pesca de São Paulo, Ubatuba, SP
*esanches@pesca.sp.gov.br

 

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