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01 de Fevereiro de 2018 Aquaculture Brasil
Streptococcus agalactiae: um velho e indesejável conhecido ressurge com novidades

A estreptococose é uma doença que afeta pisciculturas de todo o mundo, causando perdas econômicas devido aos altos índices de mortalidade. Trata-se de uma “velha conhecida” de quem trabalha com a produção de tilápias no Brasil, pois seus primeiros relatos no país surgiram por volta de 2004. A doença geralmente se manifesta em peixes na fase de engorda, período em que o produtor já investiu muito em alimentação e manejo dos animais. Surtos com elevada mortalidade estão relacionados com elevação da temperatura da água (o que caracteriza-a como uma doença de maior frequência no verão), alta densidade e a não vacinação dos animais. O tratamento com antibióticos é uma alternativa usada apenas em último caso (emergencial) e pode auxiliar na redução dos prejuízos dos produtores. Contudo, o uso indiscriminado de antibióticos é totalmente não recomendado. O ideal é sempre trabalhar com medidas preventivas de manejo, vacinação e produtos que estimulem o sistema imune dos peixes, como por exemplo, pré e probióticos.

 

 

 

 

Adicionalmente, existem dúvidas se o tratamento com antibióticos são 100% eficazes, pois apesar de geralmente cessarem a mortalidade, existe a chance da bactéria continuar viva no organismo dos peixes e/ou ficar aderida às estruturas das gaiolas e fundo dos tanques, o que chamamos de biofilme. Bactérias que produzem biofilme se aderem à superfícies sólidas podendo permanecer vivas por longos períodos e com isso, após o término do tratamento com antibiótico, infectar novamente os peixes fazendo a mortalidade voltar (Figura 1). A formação de biofilme dificulta a desinfecção das instalações e equipamentos, pois o biofilme protege as bactérias de produtos desinfetantes através de formação de camadas de microrganismo, com isso, algumas dessas bactérias não são alcançadas pelo produto.

Essa habilidade da nova cepa de Streptococcus agalactiae do sorotipo III (descrita no Brasil pela primeira vez por nossa equipe, sendo o tema central deste artigo) justifica a recorrência da doença mesmo após o vazio sanitário e desinfecção dos tanques. Além disso, faltam protocolos para o tratamento desta doença, assim como estudos com informações de monitoramento de todo o país mostrando que os dados de resistência aos antibióticos já encontrados são escassos.

Em casos recorrentes, o produtor deve realizar programas sanitários, como por exemplo, vazio sanitário por maior período, com remoção e limpeza dos tanques, lavagem e desinfeção dos equipamentos e repovoamento (adquirindo formas jovens de produtores que monitorem com frequência por meio de diagnóstico laboratorial o plantel). Fatores como qualidade da água, nutrição e manejo incorreto também podem favorecer a instalação da doença. Para evitar que a doença retorne ou entre em um criatório, medidas prevetivas como a vacinação e a aquisição de alevinos monitorados por diagnóstico laboratorial são essenciais. Contudo, atualmente são poucos os larvicultores que realizam frequentemente o monitoramento laboratorial.

 

Novo sorotipo de S. agalactiae

Em dezembro de 2016, um surto de estreptococose em seis pisciculturas em tanques-rede no nordeste brasileiro, revelou um novo sorotipo de S. agalactiae, nunca encontrado no Brasil. No mundo todo, dez sorotipos já foram identificados em humanos, bovinos, peixes, dentre outros hospedeiros. Neste surto especificamente, a bactéria isolada foi caracterizada como sorotipo III. Com o aparecimento desse sorotipo surgem questionamentos a respeito da forma como este novo sorotipo entrou no país e como esta situação é alarmante:

  1. Os peixes tiveram contato com a bactéria de outros animais (principalmente aves migratórias e animais aquáticos selvagens) ou ser humano e esta conseguiu infectar/adaptar aos peixes;
  2. Falhas nas barreiras sanitárias (diagnóstico laboratorial rotineiro nos criatórios de alevinos) em polos produtores permitiu a entrada da bactéria em locais onde ela não estava presente;
  3. A falta de controle e/ou monitoramento deste novo sorotipo pode levar a sua disseminação para outras regiões causando prejuízos econômicos e para a saúde pública, pois esta bactéria multirresistente a drogas pode vir a infectar o ser humano.

Deve-se lembrar que este novo sorotipo de S. agalactiae foi identificado por nossa equipe apenas em uma região do país e até o momento esta bactéria não foi encontrada em outros polos produtores de tilápia. A vacina atualmente comercializada no país não protege contra este sorotipo da bactéria, sendo portanto fundamental o monitoramento por diagnóstico laboratorial da estreptococose em todo o país.

O sorotipo III é de grande importância para a saúde animal e humana. No homem, a sua manifestação tende a ser bem severa principalmente em recém nascidos e idosos. Estudos já demonstraram que este sorotipo pode infectar diferentes espécies, podendo ser transmitida de humanos ou bovinos infectados, para peixes. Esta plasticidade característica do sorotipo III leva a suspeitar que este agente esteja causando doença em peixes nativos e em animais nas redondezas do tanque-rede, que por sua vez, ajudam a espalhar a doença.

 

 

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Métodos de tratamento

O tratamento para S. agalactiae no Brasil ainda possui muitas limitações, sendo apenas dois antimicrobianos (florfenicol e oxitetraciclina) liberados para o uso na tilapicultura. A oxitetraciclina ainda tem o uso controverso no tratamento da estreptococose, pois alguns estudos afirmam que este antimicrobiano só promove a cura clínica durante o tratamento, mantendo ainda o estado de carreador assintomático em tilápias infectadas. Essa variante isolada no nordeste apresentou um perfil de resistência para uma vasta maioria de antimicrobianos conhecidos, como: norfloxacina, ampicilina, aminoglicosideos, fluorquinolona, sulfametazole com trimetroprim e tetraciclina. Neste mesmo teste, o florfenicol, antimicrobiano geralmente utilizado para o tratamento de estreptococose, foi um dos antimicrobianos que este sorotipo novo da bactéria foi sensível (Tabela 1).

A vacinação dos peixes é uma estratégia de prevenção de doenças na piscicultura, incluindo a estreptococose. Entretanto, ainda faltam informações a respeito da proteção múltipla para vários sorotipos de S. agalactiae, pois a vacina atual contém apenas sorotipo Ib (mais prevalente no Brasil). Portanto, mesmo com a vacinação dos peixes contra estreptococose, a propriedade pode ainda estar vulnerável a outros sorotipos de S. agalactiae. Como é o caso do surto ocorrido no nordeste, onde os animais foram vacinados com a vacina disponível comercialmente no país (que protege apenas contra o sorotipo Ib) e mesmo assim tiveram a infecção pelo sorotipo III. Neste caso, seria importante desenvolver uma vacina para os produtores dessa região que utilize a mesma variante isolada neste surto. Além disso, avaliar a viabilidade da produção de uma vacina bivalente, ou seja, uma vacina que proteja contra ao menos estes dois sorotipos de S. agalactiae (sorotipo Ib e III).

 

CONCLUSÃO

Surtos de doenças na piscicultura devem ser melhor monitorados, com acompanhamento de técnicos competentes os quais sempre poderão tomar as medidas mais adequadas para reduzir os prejuízos dos produtores. Tratamentos com antibióticos sem a indicação de um técnico especializado devem ser evitados, pois somente um profissional capacitado saberá da viabilidadade, dosagem e instruir corretamente o produtor. Além disso, é importante que os técnicos de campo enviem amostras para diagnóstico laboratorial, para que seja possível manter um monitoramento epidemiológico constante das doenças recorrentes. Assim, é possível saber de forma mais rápida quando uma bactéria mais resistente a antibióticos ou uma nova bactéria surgir, causando prejuízos a produção nacional de peixes.

 

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