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20 de Janeiro de 2022 Aquaculture Brasil
Maricultura da macroalga Kappaphycus alvarezii como suporte ao desenvolvimento sócio econômico no litoral do estado do Rio de Janeiro

O século XXI tem sido marcado por desafios no plano social e ambiental que colocam a humanidade frente à necessidade eminente de revisão no seu modo de vida, que tornou-se insustentável. Portanto, urge transformar a matriz produtiva e energética, hoje baseada na extração de recursos naturais finitos e geradora de resíduos poluentes com impacto desastroso no meio ambiente, bem como, superar a exploração exaustiva da mão de obra que delineia um cenário de extrema desigualdade sócio-econômica. 

No Brasil, particularmente no Estado do Rio de Janeiro, carece de atividades produtivas que venham na contramão da história a demonstrar que é possível realizar um negócio rentável, sustentável e em harmonia com o meio ambiente onde todos os atores envolvidos se beneficiem, rompendo a barreira ideológica que coloca o ganho financeiro como contraditório ao bem-estar social, econômico e à saúde ambiental.

Dentro deste conceito, o Cultivo de Macroalgas (Maricultura de Algas Marinhas) surge como alternativa atraente e de implementação factível para o desenvolvimento sustentável, que pode contribuir para melhorar de forma significativa as condições sociais em que se encontram as comunidades pesqueiras e ribeirinhas do estado, englobando, sobretudo, os jovens e as mulheres. Sendo assim, esse artigo foi dividido em dois capítulos que irão abordar de forma geral os principais aspectos do cultivo de macroalgas.

 

 

1. Introdução

O potencial do uso das algas marinhas é conhecido mundialmente devido à grande variedade de usos e aplicações industriais que vão desde a alimentação direta em humanos, em animais, em coloides, cosméticos, medicamentos e biofertilizantes agricolas. Além destes usos, as algas do gênero Kappaphycus também podem produzir Biocombustível, etanol de terceira geração e posteriormente Créditos de Carbono, mais um produto a ser explorado, a médio ou longo prazo por esta cadeia produtiva. Entretanto, a Macroalga Kappaphycus alvarezii é principalmente utilizada como fonte de matéria-prima para a produção de ficocolóides conhecidas como Carragenas, utilizadas como estabilizantes e espessantes na indústria alimentícia (produtos cárneos, bebidas, chocolates, rações, cosméticos, etc), representando um mercado mundial da ordem de US$ 6,00 milhões anualmente (FAO 2006).

A K. alvarezii também é conhecida comercialmente como Eucheuma cottonii ou simplesmente “Cottonii”, e teve cerca de 11.6 milhões de toneladas vivas ou molhadas produzidas em 2019 (FAO, 2021), principalmente em fazendas marinhas nas Filipinas, Indonésia, Malásia, Tanzânia e Zanzibar (Philp & Campbell 2006, Pickering et al. 2007, McHugh 2003). 

Nessas regiões são gerados milhares de empregos e benefícios diretos para centenas de  famílias, diversificando as atividades tradicionais, diminuindo a pressão ambiental sobre os ecossistemas e melhorando a economia de áreas deprimidas e populações vulneráveis.

K. alvarezii já foi introduzida intencionalmente para fins de maricultura em mais de 20 países como a Oceania, Panamá, Cuba, Caribe, Equador, Brasil, Índia, Sri Lanka, Camboja, Vietnã, Mianmar e África Oriental (Quênia, Tanzânia, Moçambique e Madagascar) (Ask 1999, Pickering et al. 2007).

 

1.1 Histórico do cultivo e introdução da macroalga Kappaphycus alvarezii no estado do Rio de Janeiro

Em 1998 a empresa Seaweed Consulting (www.seaweedconsulting.com) introduziu a macroalga Kappaphycus alvarezii no Rio de Janeiro, mais especificamente na Ilha Grande – Angra dos Reis, para estudos de ecologia e cultivo experimental. 

Os exemplares (20 quilos) foram trazidos da Venezuela (“Ilhas Coche”) gentilmente fornecido pelo Dr. Raul Rincones da empresa Biotecmar C.A e com Certificado Fitossanitário do governo Venezuelano. Após a chegada no Brasil, as algas passaram por uma breve quarentena no Laboratório de Camarões Marinhos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) onde também foram deixados alguns exemplares para o cultivo unialgal para o professor Dr. Roberto Derner do Laboratório de Microalgas desta instituição. 

Em seguida as algas foram levadas para o litoral sul do estado do Rio de Janeiro, mais precisamente para a Enseada de Aracatiba na Ilha Grande, Angra dos Reis - RJ e partir daí, esta região foi cenário durante vários anos com o primeiro projeto de cultivo piloto e comercial da macroalga K. alvarezii no Brasil.  

Em 2002 a Seaweed Consulting iniciou o primeiro cultivo em grande escala para a empresa Sete Ondas Biomar culminando na instalação de mais de 100 balsas de 450 m2 de cultivo de Kappaphycus na Restinga da Marambaia, sendo que após alguns anos esta empresa se transformou na atual AlgasBras, a qual vem fomentando a atividade no litoral do Rio de Janeiro para os produtores na região da Baia da Ilha Grande.

 

1.2 Regulamentação dos Cultivos da macroalga K. alvarezii no Rio de Janeiro

Em 2003, o IBAMA – RJ (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) – através de sua Gerência Executiva, emitiu para a Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca – RJ, a primeira anuência para o Cultivo de K. alvarezii e com reconhecimento da introdução destas algas provenientes da Venezuela, para a região da Baía da Ilha Grande – RJ. Entretanto, somente em 2008 o IBAMA - DF através de uma Instrução Normativa publicada em diário oficial, autorizou o cultivo comercial da macroalga K. alvarezii na faixa entre Mangaratiba – RJ e Ilha Bela – SP após vários estudos comprovando a viabilidade ambiental como segura para o cultivo desta espécie, principalmente no litoral do Rio de Janeiro. 

Recentemente em 2021, a empresa Seaweed Consulting (www.seaweedconsulting.com), obteve do Governo Federal (MAPA) a primeira concessão de área especifica para o Cultivo da macroalga K. alvarezii no Brasil através de um contrato de cessão de uso do imóvel situado no mar territorial, na baía de Ilha grande, no município de Angra dos reis, no estado do Rio de janeiro, como outorgante cedente a união, por intermédio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e, como outorgado cessionário Miguel C. Sepulveda Jr. (CEO Seaweed Consulting).

 

 

2.Metodologia para instalação do cultivo de K. alvarezii

2.1 Parâmetros para escolha da instalação do Cultivo

Algumas características são fundamentais para escolha do local a ser implantado o cultivo de algas, as principais seriam:

  •  Temperatura da água do mar acima de 20°C durante todo o ano;
  •  Salinidade acima de 25 ppt;
  •  Zonas protegidas do embate de ondas fortes (preferencialmente devem ser escolhidas enseadas protegidas);
  •  Profundidade máxima de 20 metros;
  •  Áreas livres do tráfego de embarcações e turismo.

 

2.2 Biologia da Macroalga Kappaphycus alvarezii

A reprodução sexuada desta macroalga é bem difícil de se encontrar no ambiente natural, portanto, essa espécie se reproduz quase que exclusivamente por meio de reprodução vegetativa (crescimento com fragmentos vegetativos). Devido a esta característica, os cultivos de K.alvarezii tiveram um grande sucesso em mais de 20 países onde foram introduzidas, devido a técnica de propagação ser relativamente simples.  K. alvarezii é uma espécie de alga robusta, que possui flutuabilidade negativa, portanto, é incapaz de crescer livremente na coluna de água e se mover por longas distâncias sem a ajuda do homem, e também não possui a capacidade de se fixar ao substrato (Russell 1983, Pickering et al. 2007, Oliveira & Paula 2003). Estas algas dependem de sua pouca capacidade de se enredar em substratos duros ou de seu peso para ficar em um local específico, pois a maioria dos talos que se desprendem dos locais de cultivo são transportados pelas correntes para profundidades maiores onde acabam morrendo devido às condições desfavoráveis para seu crescimento, como a falta de luz, baixa temperatura ou a presença de predadores (Pickering et al. 2007, Sulu et al. 2004, Ask et al. 2003, Salazar 2000, Oliveira & Paula 2003).

 

2.3 Método de cultivo

2.3.1  Balsas Flutuantes de PVC

Atualmente o método tradicionalmente utilizado pelos produtores no Rio de Janeiro é conhecido como “Balsas Flutuantes”, trazido pelo pioneirismo da Seaweed Consulting em 1998, após alguns anos testando o sistema mais eficiente em locais com profundidade acima de 5 metros. Basicamente este sistema consiste em estruturas flutuantes confeccionadas com Tubos de PVC 100 mm ou 75 mm com 3 metros de comprimento, fechados em suas extremidades com tampas, funcionando como flutuadores.  Os tubos são unidos entre si com cabos de Polipropileno ou Polietileno de 8mm. Dependendo da região de cultivo as Balsas podem variar de 75, 100 até 150 metros de comprimento, onde também pode ser necessária a utilização de uma rede de nylon na parte inferior da estrutura para proteção contra herbívoros como peixes e tartarugas, embora este aparato seja uma exigência do IBAMA de cordo com a instrução normativa de 2008.

 

2.3.2  Método de plantio “Tie-die”

Este método é tradicionalmente utilizado no mundo para o plantio das macroalgas do gênero Kappaphycus, conhecido como “Tie Tie”, foi criado na década de 70 nas Filipinas e largamente utilizado até hoje em diversos países. Neste sistema, as algas são amarradas em um pequeno cabo ou fitilho de plástico através de um nó de “forca” na linha principal de cultivo fazendo com que as mudas fiquem mais livres e com maior facilidade e rapidez para seu crescimento.

 

2.2.3  Redes “tubulares”

Este método foi trazido para o Brasil em 2001 pelo empresário Alexandre Feder (CEO da empresa AlgasBras (www.carragenabrasil.com.br) ficando conhecido como “Plantio em Rede Tubular” o qual vem sendo largamente utilizado até o momento pelos produtores.  Embora as redes tubulares sejam tradicionalmente utilizadas em cultivo de mexilhões na Europa, estas podem ser adaptadas para o cultivo de diversas espécies de macroalgas. Atualmente este método está sendo utilizado em diversos países como o Equador, Panamá, Índia, Moçambique, Tunísia, Quênia e Caribe. Neste sistema, as mudas de algas são inseridas na rede tubular através de um tubo de PVC 75mm com 1 metro de comprimento, sendo que, apesar de ser bastante eficiente e mais rápido, as algas demoram mais a responder em seu crescimento, pois ficam presas dentro das redes.

 

2.3.3  Produtividade nas Fazendas de Algas Kappaphycus

Em vários Países que tradicionalmente cultivam a macroalga K. alvarezii, o ciclo de cultivo é de 45 a 50 dias desde do início do plantio até a colheita. Entretanto vários fatores precisam ser levados em consideração durante o processo de avaliação da produtividade, como o método de cultivo aplicado, o manejo, a temperatura da água do mar local, a salinidade, a velocidade das correntes marinhas, turbidez da água, herbivoria (peixes e tartarugas) e qualidade das mudas selecionadas para o plantio. No litoral sul do Rio de Janeiro, mais especificamente em Angra dos Reis (Ilha Grande) a produtividade em média obtida nestes últimos 20 anos de cultivo, tem sido de 6 a 7 toneladas frescas em Balsa de 450 m2  a cada 45/50 dias em sistema de cultivo “Tie – Tie” (método de amarração das mudas de algas). 

Este dado pode ser menor quando se cultiva as algas no sistema de Redes Tubulares com tempo de cultivo de pelo menos 60 dias. Além disso, vale ressaltar que o produtor, para iniciar seu cultivo, adquira por uma única vez apenas um lote de mudas e daí em diante a propagação é vegetativa permitindo que ele não precise mais comprar novas mudas, sendo apenas necessário manter um estoque para o replantio. A compra das mudas pode ser feita entre os próprios produtores com valores entre R$ 5,00 o quilo.

 

 

3.Conclusão

No artigo da próxima edição iremos abordar as doenças e pragas nos cultivos, os subprodutos obtidos, aspectos ambientais, custos de instalação de uma fazenda marinha de macroalgas e as estratégias de intervenção para o fomento da maricultura de macroalgas no estado do Rio de Janeiro.

 

Faça o download e confira o texto completo com todas as ilustrações. Clique aqui

 

Autor: Miguel Sepulveda
Biólogo Marinho
CEO Seaweed Consulting
Ilha Grande, RJ
seaweedconsulting@gmail.com
www.seaweedconsulting.com

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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