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Cultivo de Peixes
01 de Junho de 2018 Aquaculture Brasil
Menor renovação de água diminui a agressividade no acará-bandeira

Algumas espécies de peixes apresentam comportamento social e interagem de maneira agressiva para estabelecer hierarquia de dominância e defender seu território. O animal vencedor das lutas torna-se dominante e terá maior acesso aos recursos do ambiente do que os demais animais submissos (Gilmour; Dibattista; Thomas, 2005). Assim, para evitar lutas intensas, as quais podem acarretar danos, os peixes mantém a posição social definida (dominante ou submisso) usando sinalizações visuais, sonoras e químicas. Os sinais ou pistas químicas são substâncias que os peixes liberam na água e que sinalizam sua posição social para outros indivíduos, permitindo que as lutas sejam reduzidas no grupo (Gonçalves-de-Freitas et al., 2008). Em aquários e ambientes de criação, a renovação de água é necessária para remover restos de alimentos e materiais orgânicos que se acumulam no ambiente. Porém, a renovação de água dilui os sinais químicos presentes no ambiente, interferindo no reconhecimento da posição social dos peixes dentro do grupo, o que leva ao aumento das lutas (e.g. Gonçalves-de-Freitas et al., 2008).

Com o aumento das lutas, aumenta a probabilidade de lesões corporais e elevação dos níveis de estresse. Como a renovação de água é necessária para manter a sua qualidade, o trabalho teve por objetivo investigar qual seria a quantidade mínima de água que pode ser renovada, causando menor impacto sobre a agressividade do acará-bandeira (Pterophyllum scalare Schultze 1823, Cichlidae), um peixe amazônico muito popular na aquicultura (Figura 1). 

 

 

 

 

Desenvolvimento

I - Delineamento experimental

Foram agrupados três peixes em cada aquário e cada grupo foi submetido a um dos três tratamentos a seguir (15 grupos cada tratamento, total de 45 grupos):

1- Renovação de 0% da água - (T0%);

2- Renovação de 25% da água - (T25%);

3- Renovação de 50% da água - (T50%).

Em todos os tratamentos, 50% do volume de água do aquário foi retirado (para que todos passassem pela mesma manipulação). No T0%, a mesma água retirada do aquário foi reposta, servindo como controle. No T25%, foi reposta 25% da água retirada do aquário e 25% de água nova. No T50%, foi reposta 50% de água nova (Figura 2).

Os peixes foram agrupados por cinco dias. Nos três primeiros dias eles estabeleceram a hierarquia de dominância dentro do grupo. No quarto dia foram realizados os procedimentos de renovação de água ou de retirada e devolução da mesma água (T0%). As lutas foram filmadas e quantificadas (10 min) antes da renovação, 1 minuto, 1 hora, 2 horas e 24 horas após a renovação (Figura 3).

Os níveis de amônia e nitrito na água foram medidos no quinto dia em cada tratamento e foram respectivamente: T0% - 0 ppm e 0,25 ± 0,08 ppm; T25% - 0 ppm e 0,1 ± 0,06 ppm; T50% - 0 ppm e 0,1 ± 0,1 ppm. Os valores encontrados representam baixas concentrações desses compostos na água.

II - Resultados e discussão

Analisando a soma de ataques emitidos pelos três animais do grupo, encontramos diferença entre os tratamentos (ANOVA para medidas repetidas; Figura 4). No T0%, o número de ataques 1 min após a renovação permaneceu de forma igual ao período anterior a renovação (p = 0,35) e diminuiu até 24h após (p < 0,02). Resposta esperada nesse caso, pois sem renovação de água a sinalização química entre os animais não foi perdida, assim, há uma diminuição da agressividade no grupo, diminuído os prejuízos para os animais.

Observamos um aumento no número de ataques dentro do grupo 1 min após a renovação no T25% (p < 0,0001). Porém, 1h após a renovação de água, o número de ataques já havia reduzido para valores semelhantes à antes da renovação (p = 0,08). Já no T50%, observamos um aumento ainda maior do número de ataques 1 min após a renovação de água (p < 0,0001). No entanto, houve uma redução dos ataques 1h após (p = 0,69), a qual pode ter ocorrido pelo desgaste dos animais causado pelas brigas no momento anterior (1 min após a renovação).

 

 

 

 

De acordo com Wooton (1998), interações agressivas tem um custo energético muito elevado para os peixes. Portanto, é possível que os animais desistam de lutar por não possuírem estoques de energia para continuar brigando por um longo período. Assim, quando os custos da luta aumentam, alguns sinais do metabolismo provocam redução das lutas, reduzindo os custos de injúrias e gasto de energia (Briffa; Elwood, 2001). Porém, o número de ataques voltou a aumentar 2h após a renovação e permaneceu elevado até 24h após (p < 0,0001). Esse aumento da agressividade por um tempo prolongado dentro do grupo envolve um alto gasto de energia e pode aumentar o estresse social dos indivíduos. Essas condições são indesejáveis para a aquicultura, pois podem causar redução do crescimento dos animais (Volpato; Fernandes, 1994), aparecimento de doenças (Conte, 2004) e, consequentemente, prejudicar o bem-estar dos peixes.

Maiores detalhes dessa pesquisa podem ser encontrados no artigo publicado na revista Applied Animal Behaviour Science (Gauy A.C.S., C.N.P. Boscolo, E. Gonçalves-de-Freitas. Less water renewal reduces effects on social aggression of the cichlid Pterophyllum scalare. Applied Animal Behaviour Science. v.198, p.121-126. 2018).

Conclusão

A renovação de 50% da água do aquário aumenta a agressividade no grupo de acará-bandeira. Para manter os sinais químicos presentes e evitar o aumento das lutas é indicado que se renove a quantidade máxima de 25% da água do aquário. Com esse procedimento é possível manter a qualidade da água com menor impacto sobre a agressividade dos indivíduos dentro do grupo, reduzindo a probabilidade de injúrias físicas e estresse, garantindo, assim, maior bem-estar para os animais.

 

Autores:

Ana Carolina dos Santos Gauy

Laboratório de Comportamento Animal Centro de Aquicultura da UNESP - CAUNESP

Universidade Estadual Paulista (UNESP)

São José do Rio Preto, SP

ana.gauy@gmail.com

 

Eliane Gonçalves-de-Freitas

Laboratório de Comportamento Animal Centro de Aquicultura da UNESP - CAUNESP

Universidade Estadual Paulista (UNESP)

São José do Rio Preto, SP

 

 

 

 

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