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Sistema de recirculação
01 de Agosto de 2016 Aquaculture Brasil
Sistemas de recirculação aquícola – RAS – Quando utilizar?

A aquicultura pode ser praticada em diferentes sistemas de cultivo, os quais variam de intensidade conforme a densidade de animais por metro cúbico de água, tipo de ração, fluxo de água ou mesmo o reuso da mesma. Quando temos a necessidade de reutilizar a água do cultivo, seja por sua pouca disponibilidade, preocupações com a poluição dos mananciais ou mesmo por competição por outros usos numa determinada bacia hidrográfica, temos motivos de sobra para a utilização de Sistemas de Recirculação Aquícola (do inglês, Recirculating Aquaculture Systems – RAS).

Os Sistemas de Recirculação Aquícola visam o reuso da água de cultivo após o seu devido tratamento.

Seu potencial vem sendo aplicado a cultivos de diversas espécies e em diversas fases de crescimento pelo mundo todo há mais de 40 anos

(TIMMONS e EBELING, 2013). Normalmente são recomendados para altas densidades de cultivo, pois apresentam custos de implantação em geral mais altos quando comparados aos sistemas de fluxo aberto ou sem tratamento da água residuária. A exceção é feita para o cultivo de peixes ornamentais ou mesmo para a manutenção dos mesmos. Neste último, os requisitos de qualidade de água são tais que justificam os gastos com a implantação do RAS.

 

 

Muitas espécies já são cultivadas em sistemas com recirculação da água tratada como trutas, tilápias, bagres, salmão, enguias, linguados, camarão, entre outras.
Podemos enumerar algumas vantagens dos RAS reportadas por diversos pesquisadores da área, tais como (TIMMONS e EBELING, 2013; DAVIDSON et al., 2016):

1 – Maior produtividade por área e redução significativa da necessidade de captação de água (pode chegar a mais de 90%);
2 – Efluente mais concentrado e em menor volume, sendo possível tratar este através das técnicas e equipamentos corretos, de maneira muito mais econômica e eficiente;
3 – Ambiente de cultivo mais otimizado para atender as necessidades do animal aquático, permitindo o acompanhamento mais preciso de taxas de crescimento e previsões mais seguras de despescas;
4 – Aumento da biossegurança, o que amplia o controle de doenças;
5 – Maiores possibilidades de controle de fugas de espécies exóticas, por serem cultivadas em ambientes fechados;
6 – Possibilidade de agregar valor ao cultivo com outras espécies, como por exemplo plantas aquáticas, que fazem a recuperação do nitrogênio no fluxo de resíduos;
7 – Redução da pegada de carbono ao se utilizar cultivos aquícolas em sistemas de recirculação de água.
8 – Possibilidade de aproximar a produção aquícola dos centros consumidores, pois com o uso de RAS é possível montar o empreendimento em muitos locais, com controle total sobre a água de cultivo.
9 – É considerado como um dos métodos mais sustentáveis de produção de peixes.

Contudo, há também desvantagens. A principal delas é o alto custo de investimento, além da grande dependência de energia elétrica, com fornecimento de oxigênio dissolvido e da necessidade de monitoramento rigoroso, com mão de obra qualificada para tal.

Podemos observar que as vantagens parecem ser muito atraentes e nos perguntamos: por que o Brasil ainda não utiliza esta tecnologia? A resposta é: o Brasil já possui RAS implantado e operando. No entanto, o número de RAS é ainda muito pequeno quando comparamos aos países europeus, por exemplo. No Brasil, os sistemas de cultivo com recirculação de água são utilizados principalmente nos laboratórios comerciais de reprodução, no cultivo de tilápia e alguns peixes ornamentais, nos aquários públicos e privados. Além disso, muitos laboratórios de pesquisa já realizam seus experimentos utilizando RAS.

Noruega, Dinamarca, Reino Unido, Espanha, entre outros, tem contribuído com o desenvolvimento de RAS tanto para espécies marinhas como de água doce. Estes já produzem em escala comercial com sistemas de recirculação há décadas, e há incentivos do governo para que novos empreendimentos utilizem RAS, pois os consideram uma tecnologia viável para o desenvolvimento sustentável da aquicultura (COM, 2002 e 2009). No entanto, devemos considerar que a necessidade faz a ocasião, uma vez que se sabe que há escassez de recursos hídricos nos países europeus e que no Brasil nossos problemas com água, infelizmente, apenas começaram, quando olhamos o histórico europeu.

Nas américas destacam-se os países como Estados Unidos da América, Canadá e Chile. Outros países também possuem cultivos com RAS. Pesquisadores como Timmons, M.B., Ebeling, J.M, Piedrahita, R.H., Merino, G.E. entre outros grandes nomes de destaque que produzem material técnico de grande contribuição profissional e acadêmica. De acordo com o site INTRAFISH, até 2030, os cultivos com RAS poderão responder por mais de 40% da aquicultura mundial. Então, será bom entendermos como este sistema funciona.

 

Lógica de funcionamento

De maneira simplificada, o cultivo com utilização de RAS é nada mais que acoplar um sistema de tratamento dos efluentes gerados no próprio cultivo ao fluxo de água que passa pelos tanques, fazendo com que haja o reuso da mesma no próprio cultivo, sem, portanto, o descarte contínuo das águas residuárias no meio ambiente. Para se alcançar esse objetivo faz-se necessário dimensionar uma série de equipamentos e unidades de tratamento de água, tais como decantadores ou sedimentadores, filtros mecânicos, filtros biológicos ou biofiltros, fracionadores de espumas (também conhecidos pelo seu nome em inglês, skimmers), sistema ultravioleta, sistema de ozonização, entre outros. Esses equipamentos podem ser combinados de acordo com a densidade de cultivo aplicada, além da disponibilidade de investimento. Em geral, quanto maior for a necessidade de água clara, isenta de partículas orgânicas, nitrogênio amoniacal e patógenos, mais componentes o RAS poderá ter.

Para ilustrar, apresenta-se na Figura 1 um exemplo de RAS concebido para tratar a água dos tanques de cultivo de peixe de água doce utilizados em diversos objetivos de pesquisas no Laboratório de Biologia e Cultivo de Peixes de Água Doce (LAPAD), da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A água de cultivo sai dos tanques por gravidade até o filtro de tambor, no qual são removidos os sólidos em suspensão. Em seguida a água entra no filtro biológico, cujo objetivo é a nitrificação, com a utilização de material suporte para aderência dos micro-organismos nitrificantes com auxílio de cascas de ostras na primeira câmara, que contribuem com liberação de compostos carbonatados (auxiliando na suplementação de alcalinidade necessária ao processo de nitrificação) e nas demais câmaras com materiais plásticos (tipo bobes de cabelo). Logo após a água segue para filtro de alta taxa pressurizado e tanque de equalização, no qual recebe ozônio para desinfecção e aquecimento com uso de trocador de calor. Por fim a água é bombeada para o reservatório para voltar ao cultivo de peixes.

Outro exemplo é o apresentado na Figura 2. Este sistema foi concebido pelo Laboratório de Piscicultura Marinha (LAPMAR) da UFSC. A água drenada por gravidade dos tanques de cultivo segue para caixa de equalização (conhecida por “sump”) que tem na entrada um filtro físico tipo “bag” para remoção dos sólidos suspensos. Parte da água é succionada para o filtro de areia. Na saída do filtro de areia há divisão da vazão, sendo que metade segue para filtro biológico e fracionador de espuma e outra metade segue para desinfeção com lâmpadas de ultravioleta. O sistema ainda conta com um trocador de calor para controle da temperatura. A lógica de tratamento consiste em remover partículas sólidas do maior para o menor tamanho, ou seja, desde a remoção de fezes e ração não digerida até a remoção de partículas dissolvidas como nitrogênio amoniacal, nitrito e em alguns casos o nitrato. Além disso, os RAS permitem controle sobre os parâmetros de qualidade de água e exigem maiores requisitos de gestão do cultivo no que diz respeito ao monitoramento, com profissionais treinados, pois são sistemas de grande interação entre a engenharia e a biologia, mais especificamente com a bioquímica e a microbiologia da água e suas técnicas de depuração.

No entanto, devido à grande dificuldade em padronizar os diversos modelos de sistemas de recirculação para cultivos em função das também diversas tecnologias disponíveis para remoção de sólidos e biocompostos da água, torna-se difícil usar um exemplo particular para construir um bom RAS. Logo, a compreensão do sistema é um dos fatores-chave para a sua gestão, pois isto requer correlação entre bons projetos (engenharia) e conhecimentos do comportamento animal (biologia).

Uma perspectiva interessante vem sendo discutida a fim de minimizar os custos de implantação de RAS que é a integração com outras espécies e de outros sistemas de cultivo como o bioflocos. Também é possível reduzir os custos de operação com o uso de energias renováveis como por exemplo a energia solar. Além de cultivos integrados com outras espécies como a aquaponia ou a aquicultura multi-trófica.

Como evidenciaram Badiola e colaboradores num estudo realizado em 2012, o sucesso de implementação e aplicação de RAS depende da interação e da comunicação eficiente entre os pesquisadores, os consultores, os fornecedores de equipamentos e, principalmente, os produtores que estarão a frente dessas unidades com a função de entendê-las e fazê-las trabalhar em prol da produtividade.

 

Perspectivas do futuro da implantação do RAS no Brasil

As maiores perspectivas de implantação de RAS no Brasil estão diretamente vinculadas a disponibilidade de água de boa qualidade para o cultivo.

Uma vez que o aquicultor fizer a conta que vale mais a pena recircular a água do que gastar com insumos para deixá-la dentro dos padrões de qualidade para o cultivo, valerá a pena investir na propriedade para recuperar a qualidade da água inicial e dar sequência a novos cultivos com a água tratada. Além disso, a cobrança pelo uso da água e o lançamento de efluentes, cujas leis já existem (mais que ainda não são aplicadas em muitos estados brasileiros), fazem com que não se tenha um custo financeiro pela captação da água para os cultivos.

 

Autores: Katt Regina Lapa* & Luis Alejandro Vinatea Arana
Laboratório de Camarões Marinhos (LCM), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, SC.
* kr.lapa@gmail.com

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