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Bioflocos
01 de Agosto de 2016 Aquaculture Brasil
Cultivo de camarões marinhos em sistema de bioflocos: Doze anos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico na Universidade Federal do Rio Grande – FURG, RS

O cultivo de camarões com mínima ou nenhuma renovação de água teve seu início marcado pelas primeiras citações de Gerard Cuzon e colaboradores na Polinésia Francesa nos anos 80. Posteriormente, importantes trabalhos foram realizados por Yoram Avnimelech em Israel nos anos 90. No final deste mesmo período Stephen Hopkins, Craig Browdy e Tzachi Samocha nos Estados Unidos da América realizaram importantes estudos utilizando as informações existentes, direcionando os trabalhos de produção para cultivos sem renovação ou mínima troca de água, com ativação da alça microbiana e utilização de elevadas densidades de estocagem, dando início ao que hoje é denominado de Sistema de Bioflocos ou Biofloc Technology Culture System (Sistema BFT).

O fundamento básico do sistema BFT, consiste em diminuir ou zerar as trocas de água, levando a um acúmulo dos produtos nitrogenados. Este nitrogênio inorgânico é assimilado por bactérias heterotróficas, juntamente com carbono orgânico que é introduzido no sistema. A ideia básica é elevar para 15-20:1 a relação Carbono, Nitrogênio através de fertilizações realizadas com materiais ricos em carbono tais como melaço de cana, dextrose, farelo de trigo, farelo de arroz, entre outros.

 

 

A fertilização orgânica resulta na produção de grande quantidade de bactérias heterotróficas que servem de base alimentar para toda a cadeia microbiana

(alça microbiana) que é ativada pela predação destas bactérias por ciliados, flagelados, nematoides, rotíferos, etc, que acabam constituindo os bioflocos. O processo de formação é relativamente rápido, entretanto para se obter bioflocos bem desenvolvidos com tamanho suficiente para o consumo efetivo pelos camarões são necessárias algumas semanas. O cultivo de camarões em sistema BFT possui uma serie de diferenças em relação aos sistemas convencionais de produção semi-intensiva de camarões:

1) As estruturas de cultivo apresentam menores dimensões. Os viveiros normalmente passam a ter dimensões inferiores a um hectare, sendo os mesmos revestidos por geomembranas para aumentar a biossegurança, evitar a “respiração” e interações químicas no sedimento e impedir a suspensão do mesmo para a coluna d’água. Raceways de dimensões relativamente pequenas (100, 200, 300 m²) também passam a ser utilizados para o cultivo super-intensivo nas fases de berçário e engorda;
2) Fertilização orgânica para ativação da cadeia microbiana;
3) Processos de nitrificação onde temos elevadas concentrações de produtos nitrogenados, com picos de amônia, nitrito e nitrato, os quais muitas vezes, se mal manejados, podem ultrapassar os níveis de segurança para os camarões;
4) Importantes alterações na alcalinidade, pH e concentrações de CO2;
5) Aumento significativo nas concentrações de sólidos suspensos totais (SST);
6) Em função da alta respiração microbiana e devido as altas densidade de estocagem de cultivo, os sistemas de aeração devem ser mais eficientes;
7) Monitoramento e manejo dos parâmetros de qualidade da água;
8) Utilização de altas densidades de estocagem de camarões nos berçários (1000-5000/m²) e engorda em viveiros (100-200/m²) e raceways (300-600/m²).
9) Manejo alimentar;
10) Utilização de probióticos, além de outras pequenas diferenças.

A FURG iniciou em 2004 pesquisas neste sentido com a ida de um pesquisador visitante para o Waddell Mariculture Center, na Carolina do Sul – EUA, para trabalhar com o cultivo em sistema BFT. A partir do ano de 2005 vários alunos do programa de Pós Graduação em Aquicultura da FURG passaram a realizar seus estudos diretamente aplicados ao sistema BFT, visando adaptar o sistema à realidade brasileira. Várias pesquisas foram realizadas na busca de dados e soluções tecnológicas para melhorias na operação destes sistemas. Em 2006 foi concluída na Estação Marinha de Aquacultura da FURG a construção de uma estufa com raceways para realização de trabalhos em sistemas superintensivos (Figura 1) e viveiros revestidos com geomembrana (Figura 2) para a realização de trabalhos em sistemas intensivos. Em termos experimentais no ano de 2005 foram realizados testes com espécies nativas (Farfantepenaeus paulensis e F. brasiliensis) em sistema BFT. A partir de então, se iniciaram pesquisas com Litopenaeus vannamei em sistema BFT tratando principalmente de:

 Sistemas de aeração (“blower”, chafariz, aquapás, “propelers”, pedras de aeração e injetores);
 Uso de probióticos;
 Densidade de estocagem;
 Efeitos de alcalinidade/pH/CO2;
 Sólidos suspensos totais;
 Uso de substratos verticais;
 Manejo alimentar (frequência, níveis proteicos, restrição alimentar e fontes alternativas à farinha de peixe);
 Fertilização orgânica;
 Utilização de berçários;
 Despescas parciais;
 Crescimento compensatório;
 Processo de nitrificação;
 Reuso de água, dentre outros.

Estes trabalhos foram realizados por mais de 25 alunos de graduação, mestrado, doutorado e pós doutorado, resultando até o momento em mais de 50 trabalhos em periódicos internacionais indexados, sobre o cultivo de camarões em sistema BFT. Além disso, foram publicados mais de 15 artigos de divulgação em “magazines” nacionais e internacionais, e foram apresentadas palestras e trabalhos técnicos em congressos como forma de repassar as tecnologias geradas. Recentemente, foram construídas mais duas estufas que se juntam às outras três (GH I, GH II e GH III) já existentes para pesquisa. Na estufa GH V (Figura 3) foram construídos dois raceways piloto onde estão sendo realizadas pesquisas com crescimento de camarões em densidades de estocagem superiores a 500 camarões/m². Na estufa GH IV estão sendo iniciadas pesquisas com sistemas multitróficos, incluindo camarões, peixes e halófitas em sistema BFT.

O grupo de pesquisa em cultivo de camarões em sistema BFT da FURG tem mantido uma forte relação com outros centros de pesquisa para troca de informações e desenvolvimento da tecnologia. Até o momento foram realizados dois PostDocs, oito mestrados e doutorados sanduíches nos principais centros de pesquisa que trabalham com sistema BFT (WMC e TAMU nos Estados Unidos da América, UNAM no México, UGhent na Bélgica entre outros), como forma de fortalecer o intercâmbio tecnológico relacionado ao sistema. Além disso, muitos alunos de outros estados, vindos de universidades como UDESC, UFSC, UFPR, UFRPE, UFC, UFRN, UNIPAMPA, UNESP, UFMG, entre outras, tem realizado estágios voluntários e de conclusão de curso na Estação Marinha de Aquacultura do IO-FURG, como forma de aprender, desenvolver e repassar a tecnologia para diferentes estados do país.

Em função da grande demanda por conhecimento nesta área, já foram realizados na FURG dez cursos de cultivo de camarões em sistema BFT. O publico alvo é principalmente constituído por proprietários e funcionários de fazendas de cultivo de camarões, técnicos das indústrias de insumos da Carcinicultura (indústria de rações, sistemas de aeração, laboratórios de produção de pós larvas, etc), extensionistas, totalizando mais de 300 participantes, especialmente da região nordeste do país, incluindo também participantes de diferentes países da América Latina, do Norte e Europa.

Como metas futuras, o grupo de pesquisa de camarões marinhos da FURG tem como prioridades a manutenção de pesquisas para a otimização dos sistemas BFT, incluindo principalmente questões estruturais de raceways e viveiros, biossegurança, desenvolvimento e uso de rações ambientalmente amigáveis, processos de nitrificação, dentre outras questões que venham a auxiliar no desenvolvimento tecnológico do sistema BFT.

Agradecimentos: Os autores agradecem ao CNPq, CAPES, FINEP, FAPERGS e ao extinto MPA, que foram fundamentais na estruturação do laboratório, financiamento de bolsas e custeio das pesquisas. Além disso, as empresas GUABI®, Trevisan®, INVE Aquaculture, Aquatec e All-Aqua têm sido parceiros fundamentais nas pesquisas realizadas.

 

Autores: Wilson Wasielesky*, Dariano Krummenauer, Geraldo Fóes, Gabriele Lara, Carlos Gaona, Alessandro Cardozo, Sabrina Suita, Plinio Furtado, Barbara Hostins, Julio Zemor, Aline Bezerra & Luis Poersch.


Estação Marinha de Aquicultura (EMA), Universidade Federal do Rio Grande (FURG).
*manow@mikrus.com.br

 

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