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Reprodução de Peixes
19 de Abril de 2024 Eduardo Antônio Sanches
Reprodução de Lambari

 

 

Há ainda alguém que não conheça o tal do lambari? Este pequeno peixe ainda desperta entusiasmo em muitos piscicultores e vem ganhando espaço aos poucos no Brasil. Muito disso se deve, não apenas pelo fato do sabor inconfundível de uma porção de lambari frito no capricho, mas também pela possibilidade de ser uma ótima fonte de renda, tanto para carne, quanto para isca viva, ao qual desperta cada vez mais interesse em função do seu valor agregado na venda.

Para isso, a uma reprodução bem sucedida é o primeiro passo para a produção de juvenis e adultos com sucesso. Neste assunto, escutamos constantemente algumas pessoas comentando que a reprodução não é problema e, é fácil de ser realizada. Será? Talvez é para que tem o “know-how”, ou seja, a experiência, conhecimento técnico e estruturas que permitam a prática de reproduzir o lambari de forma rotineira. Porém, muitos produtores ainda buscam conhecimento para aprimorar a técnica e aplicá-la em sua propriedade sem depender do fornecimento inconstante de alevinos.

Lambari é o nome comum dado à múltiplas espécies de peixes Characiformes, e geralmente é associado a um peixe pequeno de rios e riachos de até 15cm, porém, quando se trata da piscicultura, a espécie mais utilizada é lambari-do-rabo-amarelo, Astyanax altiparanae ou A. lacustris a partir de recente revisão elaborada sobre a espécie1. A presente espécie apresenta desova parcelada e uma grande amplitude do período reprodutivo2, com possibilidade de sucesso a partir da manipulação ambiental, com o controle da temperatura da água3, aumento do fluxo de água4, simulação de condições de primavera no inverno5, ou mesmo na aplicação de diferentes indutores hormonais6. Essas características demostram que essa espécie apresenta uma grande plasticidade reprodutiva e possibilita a adaptação de estruturas e condições para a reprodução em laboratório por meio de diferentes técnicas.

Dentre os tipos de reprodução, a técnica mais comum é a semi-natural, ao qual se baseia na seleção das matrizes em viveiros de criação, seguido de indução hormonal com extrato bruto com hipófise de carpa (EBHC) ou hormônios liberadores de gonadotrofinas análogos (GnRHa) 6. Em seguida, machos e fêmeas são condicionados em proporções de três machos para cada duas fêmeas, ou dois machos para cada fêmea, aos quais realizam a desova espontânea entre 160 a 200 horas-grau após a indução. Os ovos vão para o fundo do tanque ou caixa utilizada, que geralmente é em forma de funil, e conectada a uma incubadora cônica, que permite que os embriões se desenvolvam. Após a eclosão dos embriões e natação das larvas, essas são soltas em viveiros previamente preparados para a larvicultura. Esse tipo de sistema apresenta vantagem por permitir a utilização de grande diversidade de estruturas, sendo caixas de água e aquários os mais comuns, que posteriormente podem ser sifonadas e os embriões destinados para as incubadoras.

Outra opção é a desova natural, em que os peixes são mantidos em viveiros escavados com condições naturais, sendo empregado a proporções dois a três machos por fêmea com densidades em torno de 10 peixes/m². Nesse caso a vegetação nas bordas, ou cobertura de 10 a 15% de plantas aquáticas servirão de substrato para as desovas e permitirão melhor aproveitamento do lote. Nesse sistema, baixa eficiência pode ser observada, pois as desovas vão ocorrer somente se as condições ambientais estiverem favoráveis, além disso, pode ocorrer predação das larvas por juvenís, diminuindo assim as taxas de sobrevivência. Porém é um sistema de baixo custo e uso de pouca tecnologia agregada.

 

 

A reprodução artificial e fertilização “a seco” é outra forma que pode ser utilizada para esses animais, mesmo sendo de pequeno porte, essa rotina pode ser aplicada com eficiência. Consiste na seleção e indução hormonal dos peixes seguida de extrusão manual dos gametas, homogeneização e adição de água para promover a fecundação dos oócitos. Nesse caso, um cuidado extra no manuseio dos animais deve ser realizado para evitar a morte dos mesmos, portanto, recomenda-se a utilização de sedativos, como por exemplo, óleo de cravo a 30mg/L, facilitando o procedimento. Além disso, o controle do momento de extrusão deve ser monitorado, pois fêmeas desovam a partir de 160 horas-grau, correndo o risco de liberação dos gametas na água e/ou perdendo a viabilidade após isso. Outro ponto que merece atenção especial, é a qualidade do sêmen, ao qual na maioria das vezes sai contaminado com urina, perdendo a viabilidade espermática 30 segundos após. Nesse caso, a coleta concomitante com soluções diluidoras (ex. Solução Balanceada de Hank) pode inibir a ativação imediata e permitir a aplicação do sêmen diretamente nos oócitos, seguindo da ativação com água limpa e incubação. Essa forma de reprodução permite a obtenção das maiores taxas de fertilização desde que o procedimento seja realizado de forma correta, porém corre o risco de ter baixa viabilidade se o momento da extrusão e a utilização de um diluidor espermático não forem utilizados adequadamente.

Outros procedimentos também podem ser utilizados, como por exemplo, a indução de peixes e soltura diretamente nos viveiros, bem como, a indução e utilização de happas e/ou tanques-rede em viveiros maiores, servindo de locais de reprodução e permitindo a separação das matrizes com facilidade. Tais procedimentos são alternativas caso os produtores não apresentam estruturas de incubação de ovos, porém podem diminuir o aproveitamento final quando o fundo do viveiro não possui condições adequadas de qualidade de água para desenvolvimento embrionário normal.

Apesar da possibilidade de utilizar diferentes formas para reproduzir os lambaris, para todas terem sucesso é necessário atenção especial em algumas características importantes, como as condições de criação dos reprodutores, com densidades, qualidade de água e alimentação adequados conforme recomendado para a espécie e também o cuidado no procedimento de seleção das matrizes, com fêmeas apresentando abdômen abaulado e macio e machos com espículas na nadadeira anal.

 

 

Em termos gerais, a plasticidade da espécie permite a utilização das estruturas existentes dentro da propriedade e, cabe aos produtores, juntamente com a equipe técnica, tomar a decisão de qual a melhor forma de obter uma reprodução eficiente. Porém, independente da escolha, essa espécie continuará gerando renda e proporcionando sorrisos para os investidores na área.

 

  1. Lucena CAS & Soares HG. Zootaxa. 2016; 4072(1):101-125. doi:10.11646/zootaxa.4072.1.5
  2. Cassel M, et al. Theriogenology. 2017; 98:1-15. doi:10.1016/j.theriogenology.2017.04.044
  3. Brambila-Souza G, et al. General and Comparative Endocrinology. 2019; 279:120-128. doi:10.1016/j.ygcen.2019.02.016
  4. Chehade C, et al. Neotropical Ichthyology. 2015; 13(1):205-211. doi:10.1590/1982-0224-20140028
  5. Evangelista MM, et al. Latin American Journal of Aquatic Research. 2019; 47(2):292-302. doi:10.3856/vol47-issue2-fulltext-9
  6. Abreu MR, et al. Aquaculture Research. 2021; 52(2):471-483. doi:10.1111/are.14905     

Autor: Eduardo Antônio Sanches - Doutor em Aquicultura Faculdade de Ciências Agrárias do Vale do Ribeira - UNESP Registro, SP eduardo.sanches@unesp.br

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Eduardo Antônio Sanches

Engenheiro de Pesca formado na Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Unioeste/Toledo, possui mestrado e doutorado em Aquicultura pelo Centro de Aquicultura da Unesp - CAUNESP/Jaboticabal. Realizou estágio de pós-doutorado pela Fapesp no Instituto de Pesca na área de Reprodução de Peixes.

Atualmente é Professor da Unesp vinculado ao Curso de Engenharia de Pesca da Faculdade de Ciências Agrárias do Vale do Ribeira - FCAVR/Unesp Campus Registro e do Programa de Pós Graduação em Aquicultura do Caunesp. Atua na área de reprodução de peixes de água doce com ênfase em qualidade de gametas e reprodução induzida.

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Charge Edição nº Publicado em 18/09/2023
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